Título: Lula vai a Chávez e reforça política externa
Autor: Denise Chrispin Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2006, Nacional, p. A6

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva inicia hoje, na Venezuela de Hugo Chávez, a primeira visita oficial ao exterior desde sua reeleição, há duas semanas.

Agendada bem antes do segundo turno da eleição, essa escolha do Palácio do Planalto levou em conta as chances elevadas de Lula na campanha eleitoral e o sinal oportuno que emitiria sobre a preservação da atual política externa no segundo mandato. O governo Lula, entre 2007 e 2010, deverá aprofundar as lideranças do Brasil com a Venezuela com o duplo objetivo de 'tourear' ações intempestivas de Chávez na América do Sul e de responder aos interesses da Petrobrás e de construtoras e exportadores brasileiros no país vizinho, sustentam fontes da diplomacia brasileira.

O presidente desembarcará na noite de hoje em Ciudad Guayana, na Venezuela, onde se encontrará com um Chávez dividido entre a Presidência de seu país e a corrida pela sua reeleição em 3 de dezembro, na qual mantém confortável dianteira. Ambos já haviam se encontrado nessa mesma cidade em 2004, quando sobrevoaram o trecho do Rio Orenoco onde ainda viria a ser erguida ponte rodoferroviária pela construtora Odebrecht, com crédito do Programa de Financiamento às Exportações (Proex).

Amanhã, os presidentes pretendem inaugurar a ponte. Também deverão inspecionar o bloco de jazidas de petróleo Carabobo 1, que está em fase de quantificação pela Petrobrás. Esse é apenas um dos seis blocos que a companhia brasileira vai explorar na faixa petrolífera do Orenoco, em parceira com a estatal Petróleo de Venezuela S.A. (PDVSA).

O Gasoduto do Sul, que cortará o Brasil e abastecerá quase toda a América do Sul com o gás venezuelano, também fará parte das conversas. O projeto de U$ 20 bilhões ainda não foi posto no papel, mas se tornou um dos mais ambiciosos instrumentos de costura da integração energética da região.

RUÍDOS

Os momentos mais interessantes do encontro, porém, estarão nas conversas privadas entre os velhos companheiros Lula e Chávez. Em Ciudad Guayana, o brasileiro tentará acabar com os ruídos no diálogo com o presidente, gerados especialmente pela interferência da Venezuela no processo de nacionalização do setor de gás de petróleo na Bolívia e pelas suas intromissões nas disputas eleitorais no Peru, México e Nicarágua.

Moderar Chávez sempre foi atribuição de Lula na Presidência do Brasil e seguirá assim no seu segundo mandato. Do ponto de vista do Itamaraty, trata-se de uma missão imprescindível para que a integração sul-americana avance sem atropelos. Em um gesto significativo, há cerca de dez dias, Lula declarou a correspondentes europeus que não há pretensões de hegemonia por parte do Brasil. Na semana passada, após receber forte apelo de Alan García, presidente do Peru e inimigo de Chávez, para 'tomar a bandeira da integração', o petista manteve a ponderação e a rejeitou. Mas deixou-se trair. Quem tentou se autoproclamar líder, afirmou, fracassou. Chávez, ao contrário, não consegue disfarçar suas ambições.

Na série de ruídos a serem apagados, estão os rumores de que a Petrobrás detonaria sua parceria com a PDVSA para a construção da refinaria Abreu de Lima, em Pernambuco. Essas versões apontavam que a companhia brasileira pretendia afastar a venezuelana desse projeto de US$ 2,5 bilhões para conduzi-lo sozinha. Tanto o Itamaraty quanto o Planalto negaram a possibilidade. Não por acaso, Lula convidou o presidente da estatal brasileira, Sérgio Gabrielli, e o governador eleito de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), para integrarem sua comitiva na Venezuela.

Na última segunda-feira, o próprio Gabrielli havia desmentido esses rumores ao falar com a imprensa. Três dias depois, Campos esteve na sede da Petrobrás, no Rio de Janeiro, para checar a informação. O diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, afastou as suas preocupações e assegurou que a parceira com a PDVSA continua em marcha e que a terraplenagem da área deverá ser realizada em meados de 2007.