Título: 'Eu nunca fui torturador', reage o coronel Ustra, codinome Tibiriçá
Autor: Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2006, Nacional, p. A9

Ele já foi o Doutor Tibiriçá, codinome do homem que chefiou e reestruturou o Destacamento de Operações de Informações (DOI) do 2º Exército de 1970 a 1974. Também é apontado como chefe do que foi o maior centro de tortura de São Paulo (502 denúncias sob seu comando), participando de ameaças e sevícias dos presos. Seu nome é Carlos Alberto Brilhante Ustra. Para os amigos, ele é o homem que debelou 'os terroristas que queriam implantar uma ditadura comunista no Brasil'.

O coronel da reserva do Exército tornou-se nesta semana o primeiro oficial que serviu ao regime militar a ser processado na Justiça por acusações de tortura. Trata-se de uma ação cível movida por uma família de ex-militantes do PC do B presa pelo DOI. Eles dizem que Ustra exibia o casal César e Amélia Telles, ambos presos e marcados pela tortura, aos filhos Janaína, de 5 anos, e Edson, de 4, também levados ao DOI.

O Estado encontrou e ouviu Ustra entre seus amigos, na Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra. Lá se reuniram o delegado Carlos Alberto Augusto, o Carteira Preta, ex-Dops, e integrantes do Movimento Integralista Brasileiro para uma palestra do coronel, que falou sobre como o Brasil 'ruma para o socialismo'.

TORTURA

Eu nunca fui um torturador. Sempre procurei tratar os presos lá no DOI com dignidade e humanidade. Foi isso que eu fiz com as presas e os jovens de lá. Tratava-os como brasileiros que estavam do outro lado. Minha função era o comando. O interrogatório era outra coisa.

GUERRA

Não é possível aplicar a Convenção de Genebra (convenção que regulamenta entre outras coisas o tratamento a prisioneiros de guerra) na guerra contra o terrorismo. Em nenhum país assolado pela guerra suja do terrorismo a convenção foi aplicada. Eles não usam uniformes, praticam atos de terrorismo contra inocentes e não respeitam as leis da guerra. (...) É fácil falar de tortura, mas só quem estava à frente do combate tem o direito de falar sobre isso.

PROCESSO

Eu não fugi. Eu estava no escritório do meu advogado às 12 horas, quando ele me disse: 'O senhor não vai depor porque a outra parte abdicou do seu depoimento.' Renunciaram ao meu direito de depor para não ouvirem a verdade que ia dizer lá (Ustra se refere ao processo movido pela família Telles). Mas eu vou dizer. Em 28 de novembro de 1972, nós estávamos na cola do PC do B, que tinha uma estrutura montada em São Paulo para mandar militantes ao Araguaia. Nós tínhamos de evitar isso para que eles não virassem uma Farc. Batemos então na gráfica do PC do B. Lá estavam a Amélia, o César, a Criméia e duas crianças. Eu disse: 'Tragam os adultos para cá e levem as crianças ao Juizado de Menores.' Perguntei aos presos se eles tinham parentes em São Paulo e eles disseram que tinham em Belo Horizonte. Era um delegado. Mas uma sargento da PM se ofereceu para ficar com as crianças até elas serem entregues ao tio. E o bobalhão aqui permitiu que os pais vissem as crianças diariamente.

ANISTIA

Nós estamos em plena Lei da Anistia e eu estou sendo processado como o comandante de uma unidade militar quando a lei diz que quem deveria apreciar meus atos é a Justiça Militar. Estou sendo processado por um crime em uma Vara Cível. O que eles querem com esse processo contra mim é acabar com a Lei da Anistia. É o primeiro passo. O objetivo deles é também receber indenizações.

LULA

Com a reeleição de Lula, o Brasil caminha a passos largos para a implantação de uma República Socialista. O presidente já falou que gostaria de fazer uma Constituinte. (...) Nós temos de respeitar essa democracia pela qual lutamos e as nossa leis têm de ser respeitadas.

SOCIALISMO

O principal objetivo do Foro de São Paulo, do qual o PT faz parte, é tornar o Brasil socialista. Os cargos mais importantes são dos companheiros. O controle da mídia é indispensável, daí o conselho nacional de jornalismo. O controle educacional se fará por meio da reforma universitária. Agregam-se a isso as ações do MST, verdadeiro exército (...), é o braço armado do PT. Só lhe falta armas de fogo que, com o apoio das Farc, seriam facilmente obtidas. Devemos comparar a situação atual com a de pré-64, o Foro de São Paulo à Tricontinental, Hugo Chávez com Fidel, Lula com João Goulart, o MST com as Ligas Camponesas e João Pedro Stédile com Francisco Julião. Conclua agora para onde o Brasil está caminhando.