Título: Fechar o pacote econômico vira 'missão impossível'
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/11/2006, Economia, p. B4

Um grupo dividido, tentando cumprir uma missão quase impossível. Esse é o estágio em que se encontra a equipe econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que elabora um pacote de medidas para fazer a economia crescer a 5% ao ano. O problema é que não há ainda acordo sobre pontos básicos. Os técnicos divergem, por exemplo, sobre se o governo vai ou não pôr um freio em suas despesas desde já. Tampouco há consenso sobre se o rombo da Previdência será atacado com reformas na Constituição ou só com medidas na área de gestão. Essa divisão faz com que surjam informações erráticas sobre as medidas em estudo.

As discussões são ainda mais complicadas porque os técnicos têm nas mãos uma conta que não fecha. O presidente Lula encomendou um pacote 'ousado' de cortes na tributação sobre o investimento, medidas que, se adotadas, deveriam estimular novas fábricas e a expansão da estrutura produtiva brasileira. Mas elas têm como provável resultado uma arrecadação de impostos menor do que a projetada pela Receita Federal. Por isso, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem insistido que as desonerações precisam ser combinadas com reduções nas despesas do governo. Do contrário, as contas públicas ficarão desequilibradas.

Mas Lula já disse em público que não quer falar em cortes. Ele também já declarou que não abrirá mão dos pilares básicos da política econômica, que são o equilíbrio fiscal, o câmbio flutuante e o controle da inflação pelo sistema de metas. Conciliar todos esses interesses é a missão da equipe econômica.

Hoje, Lula reúne os ministros da área econômica para discutir o pacote. A agenda prevê que as discussões serão sobre infra-estrutura. Segundo informou anteontem o ministro Mantega, uma das propostas a serem discutidas é a da Associação Brasileira de Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), como antecipou o Estado. Ela prevê a criação de fundos privados para financiar o setor. As aplicações ficariam isentas de Imposto de Renda (IR) e Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL), depois de um prazo de 7 a 10 anos. Amanhã, haverá outra reunião para discutir as medidas de desoneração.

Na avaliação de um interlocutor de Lula, há uma enorme relutância no governo em assumir propostas impopulares. Ao vencer uma eleição difícil depois de passar quase dois anos apanhando, o presidente resiste a assumir mais desgastes propondo, por exemplo, idade mínima para aposentadoria dos trabalhadores do setor privado. Ou impondo qualquer tipo de restrição às verbas para a área social - uma das poucas que poderiam ser cortadas, pois a ordem é preservar as verbas para investimento.

Se é possível acelerar o crescimento sem sacrifícios nem medidas impopulares, é uma pergunta que divide o governo. O Ministério da Fazenda, que coordena a elaboração do pacote, está 'rachado' entre os que defendem ajustes profundos e os que confiam no efeito de medidas pontuais.

Essa divisão ficou clara quando o secretário-executivo do ministério, Bernard Appy, defendeu uma reforma constitucional da Previdência. Mantega já havia dito que não considerava necessária uma reforma constitucional da Previdência e que melhorias na gestão poderiam combater o rombo. Essa divisão se estende à área técnica.

Anteontem, Mantega mudou o discurso e declarou estar preocupado com a questão estrutural da Previdência. Ele acrescentou que a prioridade no curto prazo seria estudar as medidas de gestão sugeridas pelo consultor Vicente Falconi. Ao mesmo tempo, ironizou as conclusões do consultor, que apontam uma economia de R$ 50 bilhões num período de três a quatro anos. Ele comentou que, se fossem efetivas, as medidas seriam 'o descobrimento da América'.