Título: Tarso ameniza fogo amigo de Ciro
Autor: Carmen Pompeu
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/12/2006, Nacional, p. A7

Ministro classifica de 'fogo fraterno' críticas do deputado eleito à Petrobrás e à aliança do governo com o PMDB

O governo preferiu ontem reagir de forma amena às críticas feitas anteontem pelo ex-ministro e deputado eleito Ciro Gomes (PSB) à política econômica e à aliança do governo com o PMDB. Depois de sair de uma reunião com o presidente Lula, no Palácio do Alvorada, em Brasília, o ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, classificou as declarações de 'fogo fraterno'. No Rio, o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, disse que não responderia a Ciro, que acusou a empresa de 'pisar na bola' e inviabilizar a instalação de uma nova siderúrgica no Ceará.

As declarações polêmicas do ex-ministro foram feitas anteontem, em entrevista à Rádio do Povo. De férias em Fortaleza, Ciro criticou a Petrobrás e ainda bateu na política econômica, criticando o baixo índice de crescimento, e na aliança firmada nesta semana entre o governo e o PMDB. 'Com todo o respeito, o PMDB é um elefante que não vai junto para canto nenhum. É um elefante com dislexia', afirmou. 'Eles aprenderam esse caráter de frente, a se impor pelo tamanhão. Mas no dia seguinte eles não conseguem convergir para nenhum assunto, para caminho nenhum.' Ciro ressalvou que pode haver saída para isso se houver 'uma hegemonia moral e intelectual clara'.

Quanto à Petrobrás, o ex-ministro acusou-a de ter se comprometido a fornecer gás para a nova siderúrgica e depois ter voltado atrás. Ele afirmou ter acesso privilegiado aos ministros envolvidos no assunto e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com quem conversará na segunda-feira. 'Estou envolvido nesse processo e, mais do que ninguém, posso garantir um testemunho dessa pisada na bola da Petrobrás', disse Ciro. Segundo ele, a Petrobrás estaria criando 'resistências burocráticas hostis ao povo brasileiro', ao não garantir o abastecimento de gás à nova empresa.

'Era uma molecagem dizer que o passo para trás da Petrobrás se deveu a alguma falha pelo Ceará', sustentou. 'É pura e simples mentira. A Petrobrás vê o Brasil a partir do seu caixa, onde está exorbitante a lucratividade.' Para Ciro, o que importa de fato na discussão é o preço do gás. 'A Petrobrás irresponsavelmente contratou uma siderúrgica e três termelétricas no Ceará, (prometendo) gás que não tinha para entregar.'

'Não me sai da cabeça que talvez a Petrobrás tenha escolhido a hora para fazer esse gesto pouco sério', afirmou, referindo-se à transição de governo no ceará, entre o atual governador, o tucano Lúcio Alcântara, e o eleito Cid Gomes (PSB), que é irmão de Ciro e teve o apoio de Lula na campanha. Para Ciro, uma parte da representação política cearense 'nunca foi de nada' e estaria preocupada com 'traficância de influência para pequenices'. Outra parte 'tem problema de castração de interlocução'. Ele citou como exemplo dessa segunda parte o desgaste sofrido pelo presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE) - na visão de Ciro, um interlocutor enfraquecido.

PANOS QUENTES

Em Brasília, Tarso avisou que o governo não responderá às críticas. 'O que o Ciro falou é fogo fraterno.' Ele disse que Ciro será 'um grande companheiro para o governo' e numa frente heterogênea, 'plural', como a que o governo está formando, é natural que haja pontos de vista diferentes. 'O Ciro é um companheiro nessa frente política. Temos que encarar essa divergência com naturalidade.' Tarso afirmou ainda que Lula, ao contrário de Ciro, acha extremamente importante o PMDB ter aceitado a coalizão com o governo. 'Obviamente, o maior partido da coalizão tem uma função definidora do seu caráter', destacou. 'O governo tem a convicção de que é necessário ter um grande partido centrista articulado nacionalmente para ter estabilidade para governar, seja que tipo de governo for.'

Sobre a Petrobrás, ele acha que 'Ciro está verbalizando de acordo com interesses regionais e as funções políticas que tem' no Nordeste. 'É uma situação facilmente solucionável pelo diálogo e as críticas não têm nenhum significado negativo na sua relação com o governo.'

Gabrielli também não respondeu às críticas de Ciro no mesmo tom. Ele afirmou que a definição do preço do gás natural é o elemento chave das discussões para o fornecimento à nova planta siderúrgica no Ceará.

'Não vou responder ao deputado que, bravamente, está defendendo os interesses do Ceará, porque isso é um negócio que está sendo discutido com as empresas', disse Gabrielli. 'A Petrobrás é uma fornecedora de gás para uma planta que tem três sócios e com eles é que deve discutir este assunto.'

Esquivando-se de dar detalhes, Gabrielli comentou que um contrato entre um comprador e um fornecedor 'não pode ser um contrato em que apenas um lado ganhe'. 'Não queremos que os incentivos dados pelo governo estadual contemplem qualquer diferença entre custos de fornecimento de gás para o consumidor comum e custo para três empresas privadas, num projeto de exportação', disse.