Título: FHC acusa governo Lula de usar estatais para fins políticos
Autor: Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/10/2006, Nacional, p. A9

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acusou o governo Lula de usar politicamente e para fins ilícitos as empresas estatais, como a Petrobrás e o Banco do Brasil, em entrevista que deu ontem à Rádio CBN. 'A Petrobrás tem de ser uma empresa pública. Não como está sendo usada, para fins políticos. Vai ver para quem eles (Petrobrás) dão publicidade. O Banco do Brasil deve ser uma empresa pública. Não para o valerioduto', atacou o ex-presidente.

Ele negou qualquer plano tucano de privatização da Petrobrás. 'Ninguém vai privatizar a Petrobrás. Eu disse isso quando foi feita a lei (quebrando o monopólio estatal no País). Eu mandei uma carta ao Senado. Eu não, sou contrário à privatização da Petrobrás', explicou.

A afirmação do ex-presidente, no entanto, foi interpretada como uma posição favorável à venda da Petrobrás e acabou sendo corrigida por ele mesmo, por meio de nota, horas depois.

DINHEIRO DAS PRIVATIZAÇÕES

Um presidente da República que ainda pergunta isso, não pode ser presidente. Porque está na mão dele para onde foi o dinheiro. Ele sabe onde foi. Foi para diminuir as dívidas do Brasil, só isso. Está lá, ele sabe que todo o dinheiro foi para o Tesouro. Todo mundo pode perguntar, mas ele não, porque ele é o dono do Tesouro. Sabe onde foi, está escrito. E, se não foi, deveria ter processado todo mundo.

PRECONCEITO TUCANO

(Lula) está fazendo uma demagogia que o presidente não devia se permitir. Ele é presidente, tem carreira política e devia ter responsabilidade moral para não dizer uma inverdade dessa. Isso é acirrar uma visão equivocada e marcar o preconceito. É o mesmo que faziam com ele no passado e eu não deixava. Quando diziam 'quem não tem curso superior não pode governar o Brasil', eu fui o primeiro a dizer 'isso não é verdade'. O mesmo preconceito, agora, ele faz ao contrário jogando contra os tucanos. É lamentável.

PSDB DOS RICOS

A votação até agora de Lula foi mais forte nas regiões do País onde o Estado é mais necessário. Onde o Estado é menos necessário, a mais forte foi do PSDB e de outros partidos. Então ricos e pobres votaram no PSDB, como ricos e pobres votaram no Lula. A oligarquia brasileira no Norte e no Nordeste votou no Lula. Isso é pobre? Essa análise é superficial. Rico no Brasil é muito pouco. Partido que vai representar rico não existe, desaparece. Partido tem de representar não só uma classe, mas sim o que fazer com o futuro de todas as classes.

DOSSIÊ

São pessoas muito próximas do presidente. Tem de explicar de onde vem o dinheiro, quem deu a ordem. Para mim não é só uma questão eleitoral, é muito mais grave do que isso. O presidente não pode só dizer: 'São uns meninos aloprados'. Mas, se são aloprados, qual a punição para eles e quem deu a ordem. São todos homens dele (Lula). Por que ele não chama todos e pergunta quem mandou fazer isso e de onde é que vem esse dinheiro? Enquanto isso não for esclarecido, (o assunto) não se esgotou. Pode não dar voto, mas não é sobre esse eleitoralismo que estou me referindo, é de algo muito mais sério.

OPERAÇÃO ABAFA

Não estou acompanhando isso de perto e não quero ser leviano. Eu acho que a polícia que tem demonstrado tanta eficiência e tanta rapidez devia mostrar que não existe (operação abafa), dando nomes aos bois. Não é possível que a esta altura, um mês depois, não se tenha descoberto qual é o caminho do dinheiro. Mas o ônus da prova não é de quem está dizendo que existe a manipulação, mas sim de quem pode dizer que não houve e quem é o responsável.

SÍMBOLO ASSASSINADO

Eu o vi de perto como um líder renovado, que mudou as práticas sindicais, que fez greve durante o autoritarismo, que inovou o modo de fazer protesto, que nasceu contra tudo que havia de podre no sindicalismo. E depois se transforma num político como outro qualquer. É uma perda histórica. O presidente Lula está assassinando o símbolo que ele representa pela sua incapacidade de entender seu momento de grandeza na história, que não era só de ganhar a eleição. Você pode ganhar a eleição de mil maneiras, mas ganhar a eleição se igualando ao que havia de mais atrasado na política brasileira... Eu não acho que esse é o caminho para alguém que tinha outras possibilidades, porque ele tem.

PT EMPRESA

Tínhamos um partido organizado à moda antiga, que era o PT. Mas o PT virou quase uma empresa, se organizou, se burocratizou, contratou gente e deu no que deu. Precisava de dinheiro, acabaram arrumando de maneira escusa, através do lixo, do transporte coletivo e chegaram no governo federal.