Título: Dividendos de estatais engordam superávit
Autor: Tereza, Irany
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/10/2006, Economia, p. B3

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal pagaram à União R$ 6,384 bilhões em dividendos de janeiro a agosto. Isso significa 66,5% de todos os dividendos pagos ao Tesouro por empresas estatais no período (R$ 9,6 bilhões).

O documento Visão de Desenvolvimento, elaborado por técnicos do BNDES, revela que 'as receitas adicionais de dividendos foram importantes para que o governo não fosse obrigado a fazer o ajuste por cortes, que poderiam ter impacto negativo sobre os programas sociais em andamento'.

Para o economista Alexandre Marinis, da Mosaico Economia Política, o documento é 'uma clara admissão que, para evitar aumento de impostos e corte de gastos, o governo está usando o lucro dos bancos oficiais, o que até agora não era admitido'.

Ele lembra que há duas formas de elevar o superávit: elevando receita ou cortando despesas. A estratégia atual do governo utiliza, em sua avaliação, uma brecha metodológica, com o benefício de as instituições financeiras não estarem incluídas no cálculo do superávit do setor público.

'O problema é que, quando se utiliza o lucro de bancos oficiais para subsidiar o cumprimento do superávit, em vez de reinvestir o lucro na própria instituição, pode-se pôr em xeque a saúde financeira do banco no médio e longo prazos. Isso, feito ocasionalmente, é uma coisa. De forma sistemática ao longo do tempo, é outra', alerta o economista.

Ele comentou que este ano marca uma explosão de transferências do BNDES à União. Pela primeira vez, o banco pagou mais dividendos do que a Petrobrás, a empresa mais lucrativa do Brasil. Foram, de janeiro a agosto, respectivamente, R$ 3.401 e R$ 2,340 bilhões. No primeiro semestre, o lucro do banco foi de R$ 3,3 bilhões, enquanto o da Petrobrás foi de R$ 13,6 bilhões.

Ernani Torres, superintendente de Assuntos Econômicos da presidência do BNDES, sustenta que os repasses dos bancos estão aumentando porque, de um modo geral, o lucro do setor bancário também está crescendo de forma muito acelerada.

'O pagamento de dividendos não está sendo feito em detrimento da expansão de nenhuma das instituições. A Caixa Econômica, por exemplo, dobrou o crédito da habitação nos últimos anos. É uma receita legítima porque são empresas estatais e têm a vantagem de não onerar a sociedade', afirmou.

O documento publicado pelo banco ressalta, por duas vezes, que 'essa fonte de recursos representa uma vantagem, pois não implica maior ônus tributário para a sociedade'. Ressalta, ainda, que as especificidades do ano eleitoral, impõem impedimentos aos gestores públicos.

'É prevista uma maior concentração de gastos no primeiro semestre. Para poder dar conta dessa situação e seguir em linha com a meta do superávit primário para o ano, o governo central pôde contar com o expressivo aumento dos dividendos pagos pelos bancos públicos no período', diz o texto.

Marinis lembra que, ao contrário das empresas estatais produtivas, como Petrobrás e Eletrobrás, as transferências dos bancos oficiais entram apenas como receita para o Tesouro, sem contrapartida. Para a Petrobrás, por exemplo, o que entra como receita no cálculo de Tesouro reduz o superávit das estatais na outra ponta. Ou seja, para o resultado consolidado, é bem mais vantajoso para o resultado fiscal o dinheiro dos bancos.

O documento do BNDES destaca que os três bancos oficiais foram responsáveis, em média, por 44% dos dividendos recebido pela União de 2000 a 2006. Mas destaca que, no caso do BNDES, a transferência de lucros caiu em proporção ao lucro líquido, de uma média de 71% entre 1997 a 2002 para 63% de 2003 a 2005.

Os porcentuais são contestados por Marinis. Primeiro, devido ao intervalo de tempo determinado. 'Me parece que é uma média discricionária. O atual regime de política fiscal com meta de superávit primário só foi introduzido em 1999.