Título: População do Japão está encolhendo
Autor: Hiatt, Fred
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/11/2006, Vida&, p. A35

O Japão entrou numa trajetória que nenhuma nação desenvolvida até hoje seguiu - um declínio inexorável e sustentado da população. Naturalmente o Japão não está sozinho. Itália, Rússia, Coréia do Sul e muitos outros também devem encolher. Os Estados Unidos são exceção entre os países avançados, não só graças à imigração, mas também ao índice de natalidade que, no geral, é mais alto também.

Mas o Japão, que encolheu em cerca de 21 mil pessoas no ano passado, está na vanguarda, e por isso será observado por todo mundo. A redução gradativa da população consumirá inevitavelmente a vitalidade do país e o condenará a uma pobreza bem-educada? Ou existe saída?

'O Japão é líder, portanto é importante para o país mostrar sucesso', diz Hitoshi Suzuki, um animado pesquisador sênior do Instituto de Pesquisa Daiwa, que se disse 'não tão preocupado'. Tão despreocupado, na verdade, que no ano passado escreveu que 'o declínio da população não é algo que precisamos temer'.

Mas por que não? Para uma população se manter estável, cada mulher precisa ter, em média, 2,1 filhos. Quando o índice de natalidade cai abaixo de 1,5 e permanece nesse patamar por algum tempo, é quase impossível uma recuperação devido ao ímpeto demográfico.

Abaixo de 1,3 é um índice considerado 'ponto mais baixo'. A China registra uma taxa de 1,7, com tendência de queda. No ano passado, o Japão soou o alarme, com um índice de natalidade de 1,25. Como resultado, a população japonesa, hoje em torno de 128 milhões, deverá cair para aproximadamente 100 milhões no meio do século.

Há 50 anos, o Japão não ficou feliz ao atingir a marca dos 100 milhões e numa rota de aumento? Sim, mas na época eram 100 milhões bem diferentes. Em 1965, o Japão tinha 25 milhões de crianças, 67 milhões de pessoas em idade produtiva e 6 milhões de idosos. Em 2050, serão 11 milhões de crianças, 54 milhões de trabalhadores potenciais e 36 milhões de pessoas com 65 anos ou mais. Ninguém sabe se uma sociedade assim conseguirá manter um espírito de inovação ou como seus capitalistas se adaptarão a um mercado em contração. Potencialmente, o número de dependentes de cada trabalhador em fase produtiva será muito maior.

Ante essa perspectiva, um país pode combater (elevar o índice de natalidade) ou tentar lidar com a situação (preparar-se para administrar as conseqüências). O Japão, em tese, prefere a primeira alternativa. A partir de 1990, o governo procurou encorajar nascimentos, mas essa política não teve nenhum impacto. Hoje o portfólio da ministra encarregada de estimular a fertilidade indica uma certa falta de foco governamental; sua pasta se encarrega de assuntos relativos aos Territórios do Norte e Okinawa, ciência e tecnologia, inovação, questões sociais e igualdade de sexos, e segurança alimentar.

Na verdade, o Japão não parece querer mudar como deveria para aumentar o índice de natalidade. Em pesquisas de opinião, as mulheres japonesas dizem que desejam ter dois filhos, mas um número espantoso delas retarda ou mesmo se priva do casamento e da maternidade ou porque os pais não ajudam em casa ou porque as mães sentem-se isoladas em apartamentos minúsculos e é muito difícil para uma mulher unir carreira e maternidade.

Em teoria, o governo está dedicado a reformular isto. Na prática, sua filosofia parece adequadamente expressada pelo secretário do vice-chefe de gabinete, Hakubun Shimomura, que, neste mês, ao ser pressionado sobre as longas listas de espera nas creches públicas, disse que o problema seria solucionado se as mães 'apenas ficassem em casa e criassem seus filhos'.

Sobre esse comentário, o primeiro-ministro Shinzo Abe diplomaticamente evita contradizer Shimomura, mas afirma que seu objetivo é oferecer alternativas para que as mães possam trabalhar ou ficar em casa, como acharem conveniente. Porém deixou claro também que está mais preocupado em lidar com as conseqüências do problema do que evitá-lo. 'Mesmo considerando o declínio da população, estou convencido de que o Japão conseguirá continuar num ritmo de crescimento', disse.

O truque estará na 'inovação', e reformas econômicas, disse. De fato, robôs e outros recursos para aumentar a produtividade constituem um dos possíveis caminhos para o crescimento econômico, apesar do envelhecimento da população.

Outras rotas estariam fazendo melhor uso das mulheres; a imigração, que aumentou ligeiramente mas continua impopular num país etnicamente coeso; e ainda manter os idosos trabalhando por mais tempo. Segundo Naohiro Ogawa, especialista em população na Universidade de Nihon, se cada pessoa mais idosa, porém saudável, continuar trabalhando, a economia global do Japão em 2025 equivalerá a cerca de US$ 6,81 trilhões em vez dos cerca de US$ 5,30 trilhões projetados hoje, um aumento de 28%. Só com o aumento da idade de aposentadoria de 60 para 65 anos, haverá um aumento de 12%.

Não serão todos os idosos que vão trabalhar. Mas, disse Ogawa, 'haverá alguns ajustes. O Japão não vai se desintegrar'.

Contudo, poderá declinar. Toru Suzuki, demógrafo do Instituto Nacional de Pesquisa sobre População e Previdência Social, acredita que o Japão acabará aceitando mais imigrantes depois que tentar todas as outras possibilidades. Mas está menos convencido do que Hitoshi Suzuki de que o país encontrará um caminho para crescer.

'Isso nos leva a uma questão muito difícil' , disse Toru Suzuki. 'O que é felicidade? Conseguiremos ser felizes sem crescimento econômico?' O Japão pelo menos descobrirá isso partindo de uma posição de riqueza.

A China, que impôs uma política de apenas um filho por casal antes de se desenvolver economicamente, poderá envelhecer antes de ficar rica. Fato que também será o primeiro registrado.