Título: AIEA detecta no Irã resíduos de urânio altamente enriquecido
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Fonte: O Estado de São Paulo, 15/11/2006, Internacional, p. A30

Inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) encontraram traços de urânio altamente enriquecido e plutônio em um centro de resíduos nucleares do Irã. A informação é de um relatório confidencial da agência da ONU, cujo conteúdo foi divulgado ontem por agências de notícias.

A divulgação ocorreu no mesmo dia em que o presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, anunciou que o Irã pretende instalar 60 mil centrífugas para enriquecimento de urânio, ignorando as acusações do Ocidente de que quer usar o processo para construir bombas atômicas.

Segundo o relatório, preparado para a reunião da próxima semana da junta de governadores da AIEA, formada por 35 países, a agência não tem como afirmar que as intenções do programa nuclear do Irã são pacíficas, como o país alega, por causa de sua contínua obstrução dos trabalhos dos inspetores, iniciados em 2003.

Os traços de plutônio e urânio foram encontrados em contêineres no depósito de Karaj, perto de Teerã. Em grandes quantidades, tanto o urânio altamente enriquecido como o plutônio podem ser usados para fabricar armas nucleares. O Irã - segundo produtor mundial de petróleo - assegura que seu programa visa apenas a suprir sua crescente necessidade de energia.

O Irã disse na segunda-feira à AIEA que o urânio encontrado pode ter vindo do combustível de um reator de água leve de Teerã. Um funcionário de alto escalão da ONU com conhecimento do relatório disse que não se deveria exagerar a importância dos resíduos encontrados. Segundo ele, as explicações do Irã estão sendo examinadas e - se confirmadas - os resíduos poderiam ser classificados como subprodutos de atividades nucleares pacíficas. Ele acrescentou que, embora os traços sejam de urânio enriquecido em grau superior ao necessário para a geração de energia, são de um grau inferior ao usado em armas nucleares. Para geração de energia, o urânio é enriquecido entre 3% e 5%; para mover um submarino nuclear, em 20%; para fabricar uma bomba atômica, em 95%.

O relatório também confirmou que o Irã instalou no mês passado uma segunda cascata de 164 centrífugas na usina de Natanz e começou a abastecê-las com gás hexafluoreto de urânio para produzir combustível nuclear. Apesar de o texto não detalhar quanto urânio foi produzido, indica que os níveis de enriquecimento eram de aproximadamente 5%. Essas atividades permanecem sob constante supervisão da AIEA. Mas o Irã continua impedindo que inspetores da agência examinem materiais e entrevistem funcionários e cientistas ligados ao programa nuclear.

Frustrados com a demora do Conselho de Segurança da ONU em aprovar sanções contra o Irã por sua recusa em paralisar seu programa de enriquecimento de urânio, os EUA aguardam a reunião da AIEA para definir uma nova agenda. A agência deve rejeitar o pedido do Irã de ajuda técnica para a construção de seu reator de pesquisa em Arak.

CENTRÍFUGAS

Ahmadinejad disse ontem que o Irã pretende instalar até março as 60 mil centrífugas para enriquecer urânio. Segundo ele, inicialmente serão instaladas 3 mil centrífugas, além das 328 que já estão funcionando em Natanz. O Irã disse anteriormente que queria uma operação de enriquecimento em escala industrial, com 54 mil centrífugas. Segundo especialistas, o Irã poderia produzir urânio para uso militar em um prazo de três a dez anos com milhares de centrífugas trabalhando sem parar.

Ahmadinejad disse que em breve o Irã terá dominado a produção de combustível nuclear, mas acrescentou que o país está longe de produzi-lo em quantidade suficiente para abastecer seu reator construído pela Rússia. Ele também declarou que o mundo finalmente aceitou que o Irã completou o ciclo de produção de combustível.

'Inicialmente, eles ficaram muito bravos', disse, referindo-se aos EUA e a países da União Européia. 'A razão era clara: eles basicamente queriam monopolizar a energia nuclear para comandar o mundo e impor suas vontades às nações. Hoje, finalmente aceitaram viver com um Irã nuclear, com um Irã que domina o ciclo de combustível nuclear.' Ahmadinejad não citou nenhuma evidência da aceitação do Ocidente da capacidade de enriquecimento de urânio do Irã. Funcionários americanos e especialistas disseram ontem que um ataque militar dos EUA contra o Irã atrasaria a suposta busca de Teerã por armas nucleares no máximo quatro anos. Um funcionário negou haver um estudo formal sobre o impacto de um ataque ao Irã.