Título: Emissão de metano pelo homem não diminuiu. Apenas se disfarçou
Autor: Amorim, Cristina
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/09/2006, Vida&, p. A19

A emissão de metano pelo homem na atmosfera não diminuiu nos últimos anos como os cientistas pensavam - ela estava apenas escondida, como mostra um estudo publicado hoje na revista Nature (www.nature.com). O metano é um dos focos do Protocolo de Kyoto, acordo global que tenta evitar as mudanças climáticas perigosas causadas pelo efeito estufa.

Os climatologistas contavam com uma queda da taxa de emissão a partir de 1999 graças ao controle e uso eficiente de gás natural em países do Hemisfério Norte. Como o metano dura só 12 anos na atmosfera (o gás carbônico fica por 100 anos ou mais), os dados eram animadores. Até que o olhar mais atento mostrou que a emissão pelo homem na verdade cresceu, principalmente na China.

A mineração de carvão é uma das principais fontes de metano no país. O governo chinês quer estimular o aproveitamento do metano retirado das minas para gerar energia. Outra fonte importante é o cultivo de arroz. Não por acaso. Os chineses, os maiores produtores mundiais do cereal, alcançaram uma safra de 183 milhões de toneladas em 2005.

O aumento não foi detectado antes porque uma das principais fontes naturais do gás, as zonas alagadas, emitiu metano em doses muito menores do que o normal. Uma coisa compensou a outra e os dados foram mal interpretados.

SECAS CONFUNDEM CIENTISTAS

Para o grupo, o motivo mais plausível são os períodos de seca registrados no Hemisfério Norte desde 1999, que diminuíram a área alagada no planeta. 'Não há evidências, mas é o que podemos dizer do ponto de vista atmosférico', diz um dos autores do estudo, Philippe Bousquet, do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França.

A revisão das taxas de emissão do metano deixa claro que este é um processo que oscila enormemente. Segundo a pesquisadora brasileira Magda Lima, da Embrapa, que não participou do trabalho, variações deste nível são observadas em plantações de arroz, por exemplo: 'O quadro não é estático e depende da interação entre planta, solo e clima'.

O novo trabalho mostra que os cientistas ainda se perdem com oscilações tão marcantes. Com isso, o acompanhamento do quadro, essencial para fortalecer políticas públicas de controle do gás, enfraquece.

'O artigo aponta duas questões importantes: a primeira é que as mudanças na concentração de metano envolvem processos que às vezes atuam em direções opostas. A segunda é que a queda na taxa de crescimento pode não ser permanente', diz Chris Field, climatologista da Instituição Carnegie, de Washington (EUA). 'A grande pergunta que fica é se a taxa crescente de metano na atmosfera irá retornar em algum momento, quando as emissões naturais retornarem aos níveis normais.'