Título: Pela primeira vez, Lula admite que nomear amigos foi um erro
Autor: Rosa, Vera e Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/11/2006, Nacional, p. A4

Pela primeira vez desde o início do governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu que errou ao ter convidado amigos para integrar sua equipe. Em almoço com 16 governadores eleitos e dois vices, todos aliados, Lula disse ter aprendido uma 'lição' com a crise política, sugerindo que a montagem do novo ministério será diferente, com mais técnicos e 'gênios' e menos amigos.

Bem-humorado, Lula chegou a dar dicas aos calouros no Executivo. 'Queria dar um conselho aos nossos companheiros governadores novos: montar um governo é 50% do sucesso do governo. Convidar alguém para ocupar um cargo é muito fácil: agora, tirar alguém é muito difícil', constatou o presidente, à mesa do almoço, num hotel elegante.'Nessa hora, não tem relação de amigo: é relação de chefe de Estado. A gente tem que convidar as pessoas mais qualificadas para a função.'

Sem mencionar os petistas abatidos por escândalos, como os ex-ministros José Dirceu, Antonio Palocci e Luiz Gushiken, Lula fez mea-culpa sobre a dificuldade em demitir companheiros. Num desabafo, aconselhou os eleitos por PT, PMDB, PSB e PDT. 'Ao invés de procurar apenas um amigo, procurem aquele que está esperando uma chance. E cada Estado, por mais pobre ou mais importante que seja, tem gente da mais alta competência à espera de uma oportunidade. Se vocês puderem, descubram esses gênios, porque eles existem e, muitas vezes, são tratados de forma secundária', insistiu o presidente. 'Aprendi uma lição: a máquina pública, quanto mais eficiente e qualificada, mais fácil será para o governante governar.'

Lula teria economizado tempo se tivesse seguido as lições de Juscelino Kubitschek (1956-1961). 'JK tinha uma regra: o importante era pôr a pessoa certa no lugar certo. Não interessava se fosse amigo, o essencial era que fosse competente', relembram auxiliares próximos, como o então deputado federal mineiro Carlos Murilo. Juscelino de cara avisava ao nomeado que, se não desse certo, ele perderia o cargo, mas a amizade continuaria a mesma.

SEM PRESSÃO

Um dia depois de fechar acordo com o PMDB e às vésperas de se reunir com o Diretório Nacional do PT para explicar como será o governo de coalizão, Lula deu sinais de que não admitirá pressão por cargos.

Ao lado do governador do Piauí, Wellington Dias (PT), Lula afirmou que provará ser possível administrar o País de forma diferente. 'Não podemos mais ficar disputando, Wellington, se vou apoiar porque ele vai me dar uma vaga em tal lugar ou vai me dar um cargo. Eu estou disposto a construir um projeto de desenvolvimento com começo, meio e fim, em que todos tenhamos responsabilidade.'

Seis horas após ter se encontrado com o PTB e garantido a permanência do ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia, Lula disse aos aliados que não está disposto a escalar o time do segundo mandato antes de firmar compromisso com os partidos. 'Antes de discutir nomes ou cargos, quero discutir que tipo de coalizão vamos fazer.'

Os governadores eleitos não apresentaram nenhum pedido a Lula, nem mesmo de renegociação das dívidas. Não quiseram dividir o grupo entre aliados - que foram convidados - e oposicionistas - ausentes.

O presidente definiu como 'extraordinária' a reunião com o PMDB, anteontem, e anunciou nova maratona de encontros, na próxima semana, com PDT, PV, PPS e aliados históricos, como o PSB e o PCdoB.