Título: 'A parte dolorosa, difícil de executar, não está lá'
Autor: Palhano, André e Velloso, Thiago
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/11/2006, Economia, p. B3

Faltou o lado do corte de gastos correntes. Essa é a síntese da opinião dos economistas do mercado financeiro entrevistados pelo Estado sobre as medidas do pacote fiscal anunciadas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. No anúncio, Mantega citou basicamente medidas de desoneração tributária e a criação de um fundo para subsidiar a construção civil.

Sobre o que o governo fará para reduzir os próprios gastos, no entanto, nem uma palavra. Nesse quesito, as afirmações de Mantega caminharam no sentido de medidas para aumentar a arrecadação por meio de um maior rigor na cobrança de impostos. E de eventuais mudanças para acelerar a cobrança da dívida ativa da União.

'Por enquanto, o governo só anunciou o que depende dele sem maiores esforços. O que precisa ser feito com maior determinação, que é o corte de despesas na própria carne, por enquanto não temos nada', avaliou o economista Júlio Callegari, do JP Morgan. 'A parte dolorosa, a parte difícil de executar, não está lá.'

A percepção, até o momento, é de que o anúncio apenas de 'medidas positivas' pareceu mais uma decisão política. Pouca gente acredita, por exemplo, que a compensação para as medidas de desoneração possa vir apenas de um maior rigor na cobrança de dívidas e tributos por parte da União. O problema, afirmam, é que as propostas de cortes de despesas que apareceram até o momento foram apenas balões de ensaio.

'Esse tipo de anúncio acaba criando mais ruído do que esclarecimento. Parece que há um lado do governo que quer fazer o País crescer mais de maneira estrutural, promovendo cortes de gastos, e parece que há outro lado querendo um crescimento rápido, imediato', disse o economista-chefe da Itaú Corretora, Guilherme da Nóbrega. 'Ainda não dá para concluir nada do que será o pacote de ajuste fiscal.'

Para a economista-chefe da Mellon Global Investments, Solange Srour, além de serem insuficientes, as medidas podem representar a repetição de uma fórmula que o governo já utilizou em momentos passados e não surtiu efeito significativo no investimento: a desoneração ruidosa para alguns setores e o aumento silencioso de tributos para outros. 'O governo não está em condições de abrir mão de nada. Como ninguém parece muito entusiasmado com o corte gastos, é possível que haja elevação de outros tributos.'