Título: Oposição reclama e teme fraudes
Autor: Lameirinhas, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2006, Internacional, p. A9

Chacao, distrito elegante de Caracas, é reduto do principal candidato de oposição à presidência da Venezuela, o governador licenciado de Zulia, Manuel Rosales. À tarde, do lado de fora de um dos centros de votação havia poucos eleitores na fila. Em contraste com a votação nos morros mais pobres, como 23 de Enero, Catia e La Bandera - onde fiscais do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) passavam vários minutos explicando aos eleitores como usar a urna eletrônica -, a votação em Chacao era rápida.

Na rua, uma partidária de Rosales, Patricia Villagas, buscava jornalistas e observadores internacionais para fazer uma denúncia: a de que a tinta indelével aplicada no dedo mínimo dos eleitores depois de votarem saía com álcool e acetona. Para provar isso, ela tentava limpar o dedo de eleitores que deixavam o local. 'Queremos um processo justo, uma eleição limpa. Quero viver numa democracia de verdade', disse ela ao Estado. 'Se meu candidato perder numa eleição justa aceitarei o resultado sem problema, democraticamente. Mas isso (a suposição de que a tinta pode ser removida) é sinal de estão tramando algo, que alguém com mais de um título de eleitor pode votar mais de uma vez.'

A reportagem do Estado procurou dois representantes do CNE no colégio e perguntou sobre a tinta. Uma delas, Raquel, assegurou que não poderia ser removida totalmente de jeito nenhum. Ao saber que Patricia estava do lado de fora demonstrando que a tinta não era confiável, ela correu até lá. 'Essas coisas me mortificam', disse.

Ao examinar a mão da partidária de Rosales, Raquel argumentou que ainda tinha resquícios da tinta na cutícula, apesar da limpeza. 'Sobrou algum resquício porque eu não estou com a intenção de promover uma fraude', rebateu Patricia. 'Mas se eu tivesse aplicado antes um esmalte incolor, poderia ter removido a tinta totalmente.' A funcionária eleitoral balançou a cabeça e voltou ao colégio.

Rosales votou em seu Estado, na cidade de Maracaibo. Em rápida declaração à imprensa, evitou falar em manipulação do processo eleitoral, mas fez um apelo ao CNE para que apurasse e resolvesse rapidamente 'inconvenientes registrados em alguns centros onde historicamente o resultado não é favorável ao outro candidato (Hugo Chávez)'.

Ele chamou a atenção para problemas de defeito nas máquinas e ausência de eleitores registrados, detectados na maior parte em seções em que a oposição tem vantagem. 'Não aceitaremos um processo dessa forma. Onde isso ocorrer, vamos protestar e evitar que a votação prossiga até que tudo seja restabelecido', declarou. 'Se as máquinas não funcionam como se espera, a eleição deve ser manual. Mas, em todo o caso, o CNE tem de tomar as medidas necessárias.'

Um fator de atraso na votação e causa de polêmica foi o uso de aparelhos de captação eletrônica da impressão digital dos eleitores. Conhecidos como captahuellas, eles foram usados em 2004, no referendo em que a oposição tentou revogar o mandato de Chávez, para evitar que um eleitor votasse mais de uma vez.

Este sábado, um dos principais assessores de Rosales, o jornalista Teodoro Petkoff, disse que ele poderia dar aos eleitores a impressão de que seu voto não era sigiloso. 'O captahuellas pode servir como um instrumento de intimidação do governo, mas não tem nenhuma utilidade.'