Título: Líder da nova 'revolução' do México não esconde o rosto
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/11/2006, Internacional, p. A11
Esqueça o subcomandante Marcos - o mascarado líder do Exército Zapatista de Libertação Nacional, grupo armado que combatia na região de Chiapas, sul do México. Em Oaxaca, a face da nova 'revolução' é Flavio Sosa, de 41 anos, com seu ar tranqüilo, seus quilos a mais e seu orgulho.
Sosa está bastante relaxado para um homem procurado pela polícia. Por ser o líder mais visível de um movimento que tem desafiado o governo do presidente Vicente Fox, chegou a afugentar a polícia desta cidade no sul do país. Há ordens de prisão contra Sosa por motins e conspiração. Isso sem contar as ameaças de morte, algo que não se deve desprezar em Oaxaca. Desde agosto, houve pelo menos nove assassinatos políticos na cidade - a maioria de esquerdistas.
Sosa é um dos líderes da Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO), reunião de várias organizações sociais. A APPO foi criada quando, em junho, a polícia mexicana tentou desalojar do centro da cidade professores que protestavam por aumento de salário e outras melhorias no ensino.
A principal reivindicação da APPO é a saída do cargo do governador Ulises Ruiz, que comanda o Estado que leva o mesmo nome da cidade. Segundo Sosa, Ruiz, do Partido Revolucionário Institucional (PRI), é um dos tantos políticos do país que privilegiou os ricos e tirou a esperança dos pobres. O movimento acusa o governador de corrupção e fraude eleitoral.
Sosa vai mais longe. Os protestos de Oaxaca são, segundo ele, o início de um movimento similar ao que levou o índio aimará Evo Morales à presidência boliviana, em dezembro. 'O movimento demonstrou ao mundo que o México é do sul, como a Bolívia; e não do norte, como os Estados Unidos.'
Por cinco meses, os manifestantes tiveram o controle do centro de Oaxaca, expulsando a polícia e espantando os turistas. Construíram barricadas, incendiaram ônibus e tomaram emissoras de rádio, para melhor propagar as mensagens revolucionárias.
Logo após o fim da greve dos professores e a morte do jornalista-ativista americano Will Bradley, há duas semanas, o governo central interveio. Fox enviou 4 mil policiais federais para retirar os manifestantes.
Mesmo com a tomada do centro, a polícia ainda não conseguiu aplacar a violência em Oaxaca. Ontem, por exemplo, quatro adolescentes mascarados lançaram coquetéis molotov contra um McDonald's, causando danos materiais.
Preocupados, os próprios líderes da APPO pediram asilo político à Igreja Católica. Mas, no sábado, o arcebispo José Luis Chávez Botello disse que não pode garantir a segurança dos esquerdistas.
Sosa já realizou o sonho de milhares de mexicanos - o de fazer a América. Ele abandonou a universidade em 1986 e foi trabalhar em Nova York, primeiro como faxineiro e depois como cozinheiro. Segundo ele, a experiência lhe mostrou 'o pouco que temos no meu país'.
Em 1989, voltou e ajudou a fundar o Partido da Revolução Democrática (PRD) - o mesmo do candidato derrotado à presidência Andrés Lopez Obrador. Chegou, inclusive, a ser eleito deputado. 'Tinha muita esperança de que podíamos fazer a diferença através das urnas.'
Em 2000, Sosa deixou o PRD e foi apoiar o atual presidente, Vicente Fox, em sua vitoriosa campanha para acabar com 71 anos de domínio dos caudilhos do PRI no país. Decepcionou-se rapidamente com Fox, que segundo ele terminou envolvido nas 'redes de cumplicidade'.
Para seus detratores, Sosa não passa de um oportunista que viu no movimento de Oaxaca uma chance para ganhar notoriedade e poder. Ele se defende, dizendo ser apenas um dos líderes do movimento que abarca sindicatos, estudantes, lideranças indígenas e moradores locais. 'Somos todos iguais. Mas, por causa da minha grande barba e da minha grande barriga, sou o líder favorito da imprensa e da polícia.'
O vice-ministro de Interior, Arturo Chávez, concorda com Sosa em um ponto: a inexistência de um líder claro na APPO. 'É difícil negociar com esse grupo. Falamos com alguns dos líderes, mas não estamos seguros de que os demais estejam de acordo.' Enquanto isso, Sosa, tranqüilo, promete que o movimento crescerá, transformando-se em nacional. 'Fox, com sua torpeza, pode gerar uma nova revolução.'