Título: Comissão propõe retirada em 2008
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Fonte: O Estado de São Paulo, 07/12/2006, Internacional, p. A18

A política do presidente George W. Bush no Iraque 'não está funcionando', assinalou ontem uma comissão bipartidária de alto nível em um relatório que pediu um imediato esforço diplomático para tentar estabilizar o país do Golfo Pérsico e permitir a retirada da maior parte das forças de combate americanas até o início de 2008.

O Grupo de Estudo para o Iraque também pediu a Washington que reduza seu apoio político, militar e econômico se o governo iraquiano fracassar em ampliar a segurança e obter a reconciliação no país - onde, após mais de três anos e meio de guerra, a violência sectária mata dezenas de pessoas diariamente.

O influente grupo, chefiado pelo ex-secretário de Estado republicano James Baker e pelo ex-deputado democrata Lee Hamilton, apresentou uma avaliação pessimista da situação no Iraque e traçou um quadro de violência desenfreada, com distúrbios se espalhando para toda a região, se os EUA fracassarem em estabilizar o país.

Entre as 79 recomendações, o grupo pede à Casa Branca que, em meio à ofensiva diplomática que deve ser lançada antes do fim do ano, abandone sua resistência em dialogar diretamente com o Irã e a Síria - acusados por autoridades americanas de incentivar a insurgência iraquiana. Também pede a Bush que reviva os esforços para obter uma 'ampla paz árabe-israelense'. Segundo o estudo, os EUA não podem alcançar seus objetivos no Oriente Médio se não se ocuparem diretamente do conflito palestino-israelense e da instabilidade regional.

Bush disse que analisará o relatório 'muito seriamente' após reunir-se com o grupo, mas a Casa Branca já deixou claro que ele não ficará atrelado a suas idéias e iniciou sua própria revisão da política iraquiana.

'A situação no Iraque é grave e está se deteriorando', disse o grupo, formado por cinco republicanos e cinco democratas. 'Não há uma fórmula mágica para resolver os problemas', disse James Baker. 'Não recomendamos a solução de manter o rumo. Na nossa opinião, essa política não é mais viável.'

O grupo propôs que a ofensiva diplomática seja lançada antes do fim do ano e recomendou que o Exército dos EUA - que já perdeu mais de 2.900 soldados no Iraque - amplie seus esforços para treinar as tropas iraquianas, com o aumento do número de militares envolvidos nessa tarefa - de 4 mil para 20 mil.

O ex-secretário de Defesa William Perry, membro do grupo, disse que esses soldados poderiam vir das atuais tropas de combate no Iraque. Mas qualquer mudança de estratégia aumentaria ainda mais os custos da guerra, que já alcançaram US$ 400 bilhões e poderiam passar de US$ 1 trilhão, afirmou Lee Hamilton.

'A principal missão das forças americanas no Iraque deveria ser a de apoiar o Exército iraquiano, que assumiria a responsabilidade pelas operações de combate', acrescentou o relatório, que levou nove meses para ser concluído.

Apesar de não estabelecer um cronograma para a transição, o documento diz que até o primeiro quadrimestre de 2008 as tropas de combate americanas não mais necessárias poderiam deixar o Iraque, dependendo das condições de segurança no país. No entanto, muitos especialistas americanos acreditam que as forças iraquianas não estarão prontas para combates em menos de três anos.

Mais de três anos e meio após a invasão que depôs Saddam Hussein, em março de 2003, cerca de 140 mil soldados americanos permanecem no Iraque combatendo a insurgência e tentando evitar uma guerra sectária entre os muçulmanos xiitas e sunitas.

Bush vem sofrendo uma dura pressão política para mudar o rumo no Iraque desde as eleições de 7 de novembro, quando os eleitores reagiram à guerra e deram o controle do Congresso aos democratas. Analistas sugerem que o relatório aumentará a pressão para que Bush encontre uma solução para o conflito, que já dura mais do que o envolvimento dos EUA na 2ª Guerra.

Os países árabes acompanharam com atenção a divulgação do relatório, reconhecendo que a situação no Iraque pode ter um grande impacto em todo o Oriente Médio. A Síria saudou as recomendações e disse que são um importante passo.

Um assessor do primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, desestimou a importância de qualquer ameaça de redução do apoio econômico e militar dos EUA. Ele disse que o Iraque tem petróleo suficiente para sobreviver e as forças iraquianas já estão quase prontas para assumir a segurança.

TRECHOS DO RELATÓRIO

'A situação no Iraque é grave e está se deteriorando'

'Não há caminho que garanta o êxito'

'A missão principal das forças americanas deveria ser a de apoiar o Exército iraquiano, que assumiria a responsabilidade pelas operações de combate'

'O caos poderia levar à queda do governo iraquiano e a uma catástrofe humana. Os países vizinhos poderiam intervir'

'Deve haver um compromisso permanente dos EUA para uma solução global de paz no Oriente Médio que implique Israel e os palestinos, Síria e Líbano'