Título: Voto feminino, independente e hispânico foi para democratas
Autor: Brownstein, Ronald
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2006, Internacional, p. A18
O realinhamento em curso na política americana se acelerou na terça-feira: os democratas fortaleceram sua posição no Nordeste e, no Meio-Oeste e no Oeste montanhoso, abriram novas cabeças-de-ponte que poderão se mostrar decisivas para a conquista da Casa Branca daqui a dois anos. Essas e outras mudanças políticas, iluminadas pela eleição de 2006 como um relâmpago em noite escura, poderão sinalizar um novo estágio na competição entre os dois grandes partidos.
Para os democratas, a senha na terça-feira era crescimento: o partido expandiu sua penetração em grupos-chave de eleitores oscilantes e fez avanços notáveis em territórios onde antes os republicanos prevaleciam. Os resultados demonstraram o encolhimento dos republicanos: os democratas reverteram os ganhos do presidente Bush na eleição de 2004 entre mulheres e eleitores hispânicos, e o Partido Republicano viu-se virtualmente eliminado no Nordeste e no meio da costa atlântica.
Como um todo, a eleição desferiu um poderoso golpe nas esperanças republicanas de que a reeleição de Bush em 2004 tivesse estabelecido um maioria política duradoura, ainda que estreita, para o partido. Em vez disso, os EUA se apresentam agora como uma nação politicamente dividida ao meio - e a iniciativa, desta vez, possivelmente está com os democratas. 'A caminho da eleição de 2008, nenhum partido detém uma vantagem significativa', afirmou o estrategista político Simon Rosenberg, chefe da organização democrata centrista conhecida como NDN, num memorando divulgado no dia seguinte à eleição.
Os ganhos democratas mais expressivos apareceram nos 11 Estados do Leste, estendendo-se de Maryland ao Maine. Muitos desses Estados já foram redutos do Partido Republicano, mas passaram a tender para os democratas, nos últimos 50 anos, à medida que os republicanos identificavam-se cada vez mais com o conservadorismo social e a ideologia do 'governo enxuto' de sabor sulista.
Essa tendência, somada à antipatia por Bush e a condenação à guerra no Iraque, garantiu poderosos avanços para os democratas no Leste na terça-feira.
A depender dos resultados finais em duas disputas apertadas, os democratas da região conquistarão até 12 cadeiras na Câmara, desalojaram senadores republicanos na Pensilvânia e Rhode Island e abocanharam governos estaduais antes republicanos em Massachusetts, Nova York e Maryland.
Quando o próximo Congresso se reunir, os democratas terão 68 das 92 cadeiras da região na Câmara. Também terão o controle de 17 das 22 cadeiras regionais no Senado (Bernie Sanders, de Vermont, e Joe Lieberman, de Connecticut, que foram eleitos como independentes, pretendem compor com o partido no Congresso).
Dois avanços democratas chamam a atenção. Um deles foi o êxito em comunidades menores que enfrentam problemas econômicos no Meio-Oeste, onde Bush se deu bem em 2000 e 2004. Os democratas bateram três membros republicanos de Indiana na Câmara em distritos com essas características, e o democrata Sherrod Brown mostrou força nessas áreas derrotando o senador republicano Mike DeWine em Ohio. O outro avanço democrata importante ocorreu no Oeste montanhoso. Os democratas capturaram uma cadeira dos republicanos no Colorado e duas no Arizona para a Câmara. Em Montana, o democrata Jon Tester derrotou o senador republicano Conrad Burns. Governadores democratas venceram reeleições 'de lavada' no Novo México, Arizona e Wyoming. O democrata Bill Ritter teve uma vitória esmagadora na disputa pelo governo do Colorado, que estava em mãos republicanas.
Mas os democratas, entusiasmados por seus avanços, podem estar desconsiderando sinais de uma resistência persistente na região. Eles chegaram perto, mas não conseguiram derrotar os representantes republicanos na Câmara em Nevada e Colorado; perderam a corrida pelo governo de Nevada, não conseguiram bater o senador republicano pelo Arizona, Jon Kyl, e viram os eleitores do Colorado rejeitarem a iniciativa eleitoral que pretendia autorizar uniões civis de homossexuais e aprovar uma emenda constitucional estadual proibindo o casamento gay.
Uma das razões pelas quais os democratas se saíram bem em todo o Sudeste foi o fraco desempenho dos republicanos junto aos hispânicos. Em 2004, as pesquisas de boca-de-urna mostraram Bush com cerca de 40% dos votos hispânicos. Mas, com muitos republicanos apoiando mensagens de linha dura sobre imigração, as pesquisas de boca-de-urna da CNN indicaram que os candidatos republicanos ao Congresso receberam apenas 30% dos votos hispânicos.
O apoio republicano também caiu entre os eleitores independentes, depois dos empates registrados em 2002 e 2004. Os democratas conquistaram esses eleitores, muitas vezes com vantagens expressivas, em quase todas as 11 corridas mais disputadas para o Senado. As exceções foram Rhode Island e Nova Jersey, onde os republicanos concorreram com candidatos moderados.
As mulheres eleitoras, que se deslocaram para Bush em 2004, desta vez se afastaram dos republicanos. Preferiram os candidatos democratas nas 11 principais disputas para o Senado, freqüentemente por enorme diferença. Uma importante razão para este fato: as pesquisas de boca-de-urna revelaram que as mulheres são consideravelmente menos favoráveis que os homens à guerra no Iraque. Da mesma maneira, os levantamentos revelaram que os independentes estavam quase tão descontentes com a guerra quanto os democratas. Essas revelações sugerem que, sem avanços na estabilização do Iraque, os republicanos poderão ter dificuldades para recuperar o apoio que perderam.