Título: 'Reforma vai inibir investimentos'
Autor: Paraguassú, Lisandra e Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2006, Internacional, p. A16
A proposta do governo de Hugo Chávez de incluir na reforma da Constituição venezuelana alterações no conceito de 'propriedade' e a substituição de 'livre concorrência' por 'concorrência justa' deve inibir ainda mais os investimentos privados nacionais e estrangeiros no país. A opinião é do economista venezuelano Luis Vicente León, da consultoria Datanalisis, para quem o governo será obrigado a moderar seu discurso.
'É provável que Chávez esteja levando ao extremo suas propostas agora para depois ter margem de manobra para negociar com a oposição', diz León, que também é diretor da Câmara de Comércio e Indústria de Caracas. 'Mas só o fato de colocar em debate os conceitos de propriedade e livre concorrência gera incerteza entre os empresários - e deve se refletir nos investimentos', acrescenta.
Em sua primeira entrevista coletiva após a vitória eleitoral, Chávez afirmou que instalaria um comitê para definir alterações na Constituição assim que voltasse da viagem que iniciou ontem pela América Latina.
Na quarta-feira, o deputado governista Carlos Escarrá, que deve estar à frente da comissão parlamentar responsável pela reforma, adiantou que ela consagrará os conceitos de 'propriedade coletiva' (aquelas outorgadas à cooperativas ) e 'propriedade social' (empresas que fazem parcerias com o governo e geram 'benefícios sociais'). Também haveriam exceções no respeito à propriedade privada, já que o Estado poderia expropriar empresas alegando 'interesse social'.
Numa tentativa de tranqüilizar os empresários, o líder do comitê de Finanças da Assembléia, Rodrigo Cabezas, disse ontem que embora a reforma deva aumentar o peso do Estado na economia, 'não prevê a supressão da propriedade privada'.
León explica que apesar da alta dos preços do petróleo impulsionarem a economia venezuelana - que em 2005 cresceu 9% - em outros setores, a incerteza criada pelo 'socialismo bolivariano' de Chávez congelou investimentos. 'Essa situação explica o aumento do desemprego e da pobreza e vai se perpetuar se o governo insistir numa reforma que gere tanto risco para os empresários', diz León.
Para José Vicente Carrasquero, da Universidade Simon Bolívar, nem o próprio Chávez sabe onde quer chegar. 'Ele promete o socialismo, mas não tem certeza de que poderá levar seus projetos adiante se os preços do petróleo começarem a cair', diz Carrasquero.
José Manuel Puente, do Instituto de Estudos Superiores de Administração, concorda: 'Há uma ala radical do chavismo que prega expropriações e estatizações. Mas uma guinada ao socialismo não seria viável, pois representaria uma ruptura com os EUA, país do qual depende a economia venezuelana.'
Escarrá voltou a comentar ontem os projetos que devem ser incluídos na reforma. O mais polêmico seria uma 'redefinição dos direitos fundamentais'. Nas palavras do deputado, eles ' deixarão de ser simples direitos individuais e se converterão em direitos coletivos'. Escarrá também disse que haverão mudanças nas leis relativas aos meios de comunicação. 'Não para limitar a liberdade de expressão, mas para revisar algumas coisas', explicou.