Título: Decreto de 2002 perdeu validade
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/12/2006, Nacional, p. A4
Cinco dias depois de deputados e senadores resolverem quase dobrar seus salários, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) concluíram por unanimidade que o aumento foi dado com base em um decreto legislativo que não tem mais validade e, por isso, deveria ser suspenso. Na avaliação do Supremo, para dar o reajuste é necessária a aprovação pelos plenários da Câmara e do Senado de um decreto legislativo específico.
A decisão liminar foi tomada no julgamento de um mandado de segurança impetrado pelos deputados Carlos Sampaio (PSDB-SP), Fernando Gabeira (PV-RJ) e Raul Jungmann (PPS-PE). O STF aceitou o argumento dos três, de que o reajuste se baseia no Decreto Legislativo 444, de 2002, e este perdeu a validade com a aprovação da Emenda Constitucional 41, de 2003, que estabeleceu que o teto salarial dos servidores públicos deve ser o valor do salário dos ministros do Supremo.
No julgamento, os ministros decidiram que um reajuste para o salário dos deputados e senadores exige a aprovação de um decreto legislativo nesse sentido. Além disso, esse decreto precisa ser aprovado pelo Congresso, e não apenas pelas Mesas da Câmara e do Senado, como ocorreu. O relator do mandado, ministro Ricardo Lewandowski, disse que o tribunal deu liminar para que 'as Mesas do Senado e da Câmara se abstenham de editar qualquer ato aumentando subsídios com base no Decreto Legislativo 444'.
Depois do julgamento, Sampaio disse que a decisão do STF 'evitou uma vergonha nacional e impediu que as Mesas da Câmara e do Senado usurpassem o direito de todos os parlamentares de decidirem em plenário sobre o reajuste'. Para ele, 'a decisão restabelece a ordem constitucional, porque determina o cumprimento do artigo 49 da Carta: uma decisão sobre aumento de vencimentos só pode ser dada por lei aprovada pelo Congresso, ou seja, as duas Casas conjuntamente'.
'Estou muito feliz por ter contribuído para restabelecer a ordem constitucional, evitando aumento abusivo, inoportuno e despropositado que causou indignação em todo o País', contou. 'Neste momento que estamos atravessando, em que se discute 8% de aumento do salário mínimo, não tem sentido discutir aumento de 91% para deputados e senadores.'
O ministro do STF Marco Aurélio Mello acredita que a decisão não estabelece uma crise entre o Judiciário e o Legislativo. 'Está de parabéns a democracia, o Estado Democrático de Direito. As instituições estão funcionando. Não houve choque entre o Judiciário e o Legislativo.'
Marco Aurélio explicou que caberá ao Congresso deliberar a respeito dos salários de deputados e senadores e afirmou ser possível um reexame sobre os valores propostos.
CONFUSÃO
O dia foi bastante confuso no Supremo. Num julgamento anterior, os ministros analisaram a ação direta de inconstitucionalidade movida pelo PPS que questionava a legalidade do Decreto 444. Inicialmente, 6 ministros foram a favor de liminar para suspender o decreto. Mas isso mudou depois que Marco Aurélio observou que o decreto caducou em 2003, quando foi publicada a Emenda 41. Cezar Peluso e Joaquim Barbosa, que tinham votado pela suspensão do decreto, voltaram atrás. Em seguida, Gilmar Mendes, Sepúlveda Pertence e a presidente do STF, Ellen Gracie, seguiram o voto de Marco Aurélio.
Por 6 votos a 4, eles resolveram que não julgariam o assunto, admitindo que o decreto perdeu a validade. O julgamento do mandado de segurança dos três parlamentares contra o reajuste ocorreu logo depois da análise da ação do PPS.
Entre os dois julgamentos, foi registrado um princípio de tumulto na porta de entrada do STF. Manifestantes que protestavam contra o reajuste dos parlamentares se concentraram na frente do prédio. Policiais militares fizeram um cordão de isolamento e seguranças fecharam as portas, para evitar que eles entrassem no prédio.