Título: 'Guerra civil seria suicídio coletivo'
Autor: Kresch, Daniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/12/2006, Internacional, p. A16
O vice-chanceler palestino Ahmed Subah, ex-chefe da Representação Palestina no Brasil, tem passado dias difíceis em meio aos confrontos entre seu partido, o Fatah, e o grupo radical Hamas. Subah, um moderado, trabalha diretamente sob o comando do ministro linha-dura Mahmud Zahar, um dos principais líderes do Hamas. Apesar da violência dos últimos dias, ele tem certeza de que os palestinos vão evitar uma guerra civil. Entre uma negociação de trégua e outra, Subah, de 54 anos, deu a seguinte entrevista, em português perfeito, ao Estado.
Tanto o primeiro-ministro Ismail Haniye quanto o presidente Mahmud Abbas pediram aos militantes do Hamas e do Fatah que parem de se enfrentar nas ruas. Eles vão conseguir o que querem?
Não será com palavras e discursos que isso vai acontecer, mas sim com ações. Estamos todos empenhados em acabar com esses atos de violência, que são contrários ao interesse nacional palestino e à tradição palestina de dialogar e não se envolver em confrontos internos. Existe um diálogo nacional por meio do qual grupos políticos palestinos estão trabalhando por uma trégua. Além disso, uma delegação egípcia está na Faixa de Gaza há meses tentando facilitar esse diálogo entre facções.Temos certeza de que, nas próximas horas - ou dias - esses atos lamentáveis vão terminar.
O que temos visto, no entanto, são tiroteios e confrontos. Há perigo de guerra civil?
Não, não. Claro que não nego que temos problemas e isso é lamentável. Mas temos de lembrar que não somos um Estado independente para resolver nossos problemas da maneira que queremos. Estamos sob ocupação estrangeira. Essa consciência com certeza vai impedir que os graves acontecimentos na Faixa de Gaza sejam transformados em confrontos mais amplos. Seria um suicídio coletivo.
O sr. acredita que as eleições antecipadas convocadas pelo presidente Abbas vão realmente ocorrer, mesmo com a oposição do Hamas?
O presidente Abbas não afirmou que eleições antecipadas são a única ou a primeira opção. No discurso de sábado, ele afirmou que a prioridade é chegar a um acordo para um governo de unidade nacional com um programa político capaz de quebrar o isolamento no qual nos encontramos. Queremos retomar relações normais com o restante do mundo. Esse é o objetivo e, se conseguirmos isso amanhã, não haverá necessidade de antecipar as eleições.
Há alguma esperança de que Hamas e Fatah formem uma coalizão depois da violência dos últimos dias?
Esse é o grande esforço do presidente. Ele anunciou eleições antecipadas, mas não fixou data para a votação exatamente para possibilitar as negociações. Até porque, tecnicamente, qualquer eleição antecipada requer mais de três meses para preparações técnicas e legais. Portanto, nós ainda temos tempo para chegar a um acordo nacional. Mas, se não chegarmos a um acordo através do diálogo, entendemos que as eleições são o caminho mais apropriado e democrático para resolver o impasse político, em vez de uma guerra civil.
A situação deve ser particularmente difícil para o sr., um integrante do Fatah que trabalha em um ministério liderado pelo Hamas...
Como funcionário de carreira do Ministério das Relações Exteriores palestino, eu represento todo o povo, não só o Hamas. Altos cargos como o meu são definidos por lei, não dependem da eleição de governos. Mas, logicamente, é complicado. O povo palestino não tem grandes tradições de coabitação entre dois programas políticos diferentes. Por isso enfrentamos o que estamos enfrentando. Não é fácil para ninguém.