Título: Grampo mostra Lins agradecendo a bicheiro por eleição
Autor: Thomé, Clarissa
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/12/2006, Metrópole, p. C1

O ex-chefe da Polícia Civil do Rio Álvaro Lins era o candidato a deputado estadual do bicheiro Rogério Andrade. Em gravações telefônicas feitas durante a Operação Gladiador da Polícia Federal, César Augusto Burgos Medeiros, um dos contadores da máfia dos caça-níqueis comandada por Andrade, transmite ordens diretas para a quadrilha, às vésperas das eleições de 3 de outubro. 'Agora é pra votar no Álvaro Lins. Diz que é pra descartar aquele (outro candidato) e avisar o pessoal pra todo mundo votar no Álvaro.'

Eleito com mais de 100 mil votos, Lins ligou em 3 de outubro para Jorsan Machado de Oliveira, integrante do bando já indiciado pela PF. 'Estou ligando para agradecer aí a ajuda, a torcida, todo o trabalho de vocês. Continuamos juntos, vamos em frente que tem muito trabalho ainda.'

A PF também teve acesso a outro diálogo que associa Lins à máfia, entre dois homens identificados como Cascalho e Medeiros. Cascalho diz, na conversa: 'Com esse resultado, fica mais tranqüilo, pois terão um amigo que vai ampará-los.'

Com a Gladiador, iniciada há sete meses e divulgada na semana passada, a PF apurou que 200 policiais estavam a serviço de Andrade ou do seu rival Fernando Iggnácio, que travam uma guerra pelo controle do jogo no Rio. A PF apontou Lins como o chefe dos policiais ligados à máfia e pediu sua prisão temporária, negada pela Justiça. Além disso, o ex-chefe de Polícia pode ter o mandato cassado, a pedido do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), por crime eleitoral. O Estado procurou o advogado de Lins, Sérgio Mazzilo, mas ele disse que só vai se pronunciar hoje ou amanhã.

A denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal a partir da apuração da PF mostra exemplos da interferência da máfia nas delegacias. A investigação do assassinato, em julho, do funcionário administrativo Sérgio Duarte, lotado no gabinete de Lins, revela como as quadrilhas manipulavam inquéritos. O indiciado pelo crime foi o ex-policial militar Algacir Farias de Matos, dono de um Gol usado no crime. Só que Matos morreu em março de 2002.

O episódio veio à tona apenas em setembro e outubro, quando a 33.ª Delegacia (Realengo) ficou sob intervenção da Corregedoria de Polícia, por motivos não revelados. Para descobrir que Matos estava morto, o novo investigador do caso só precisou consultar o cadastro da Polícia Civil. O Gol fazia parte de uma lista de veículos em poder do ex-PM Roland de Hollanda Cavalcanti, outro contador da quadrilha de Andrade. 'É difícil acreditar que o investigador foi apenas incompetente, não fez consultas e indiciou o dono do carro. Até porque o Gol poderia ter sido roubado', disse um delegado.

A PF só soube do episódio na reta final das investigações da Gladiador e não teve tempo de se aprofundar no caso. Mas apurou que o inspetor Hélio Machado da Conceição, o Helinho, ligado a Lins e com prisão temporária decretada, era lotado na 33ª DP. Segundo a denúncia do MPF, Helinho trabalhava para a quadrilha de Andrade.

Noutro exemplo de interferência da máfia na polícia, policiais chegaram a combinar com Iggnácio quais celulares seriam alvo de escuta pela Polícia Civil. Num diálogo, o policial civil Paulo César Oliveira diz que um delegado (não identificado) o autorizou a apagar os números que não deviam ser monitorados. 'O delegado mandou, pediu para mim (sic) deletar.'