Título: Hamas e Fatah acertam trégua depois de 3 mortes em confrontos
Autor: Kresch, Daniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2006, Internacional, p. A10

A Faixa de Gaza transformou-se ontem num campo de batalha entre partidários das duas principais facções que disputam o poder na Autoridade Palestina, o partido moderado Fatah, do presidente Mahmud Abbas, e o grupo radical Hamas, do primeiro-ministro Ismail Haniyeh. As batalhas campais, que deixaram ao menos 3 mortos e mais de 25 feridos, explodiram depois da convocação, no sábado, de eleições gerais antecipadas pelo presidente Abbas. A medida foi rejeitada pelo Hamas, que lidera o governo desde março. À noite, a agência palestina de notícias Maan informou que os dois grupos acertaram um cessar-fogo. O porta-voz do Hamas, Ismail Rudwan, disse à Reuters que as duas facções concordaram em reiniciar conversações para formar um governo de unidade, parar as exibições públicas com armas, mandar suas forças de segurança de volta aos quartéis, soltar homens seqüestrados de ambos os lados e acabar com as pressões sobre ministros do governo.

Um porta-voz do Fatah confirmou o acordo e disse que o grupo estava tentando controlar seus militantes. Mesmo após o anúncio do entendimento, testemunhas disseram que continuavam os confrontos diante da casa de um dirigente do Fatah, Mohammed Dahlan, em Gaza.

A violência que tomou conta de Gaza já está sendo qualificada de ¿guerra civil¿ por analistas políticos e jornalistas palestinos e israelenses. Isso porque envolve grande parte da população local, não apenas milicianos leais aos dois lados.

Houve agitação também na Cisjordânia, onde manifestantes do Fatah e do Hamas tomaram as ruas das principais cidades. A maior manifestação ocorreu em Jenin, com 100 mil ativistas do Fatah.

Num dos incidentes mais graves de ontem, atiradores lançaram duas granadas de morteiro contra o complexo presidencial de Mahmud Abbas na Cidade de Gaza. No momento do ataque, Abbas estava em Ramallah, na Cisjordânia, onde mora. No tiroteio de uma hora que se seguiu ao ataque, uma palestina de 19 anos morreu e um fotógrafo do jornal francês Libération foi ferido na perna.

Uma das granadas caiu a poucos metros da TV controlada pelo Fatah. Ativistas do partido qualificaram o ataque de ¿tentativa de golpe de Estado¿, já que, segundo eles, militantes do Hamas tentaram tomar o controle tanto do complexo presidencial quanto da estação de TV.

A liderança do Hamas, por sua vez, acusou o Fatah de golpe de Estado. Isso porque, no começo da tarde, a comitiva do chanceler palestino, Mahmud Zahar, um dos principais líderes do grupo radical, foi atacada por atiradores não identificados. Zahar não se feriu.

O chanceler acusou o Fatah de tentar tomar o controle de dois ministérios em Gaza. Ele se referia à invasão, pela manhã, dos prédios dos Ministérios da Agricultura e dos Transportes por 4 mil policiais leais ao partido. ¿O que está acontecendo é um golpe de Estado, com assassinatos, tentativas de assassinato e a ocupação de ministérios.¿

A espiral de violência entre Fatah e Hamas em Gaza começou ainda de madrugada, quando homens armados invadiram um campo de treinamento da chamada ¿Força 17¿, a guarda presidencial do Fatah. Um integrante da guarda morreu. A liderança do Fatah culpou o Hamas pelo ataque, mas Abu Obeida, porta-voz da principal facção armada do grupo radical, o Qassam, negou envolvimento.

Em outro incidente, o coronel das forças de segurança palestinas Adnan Rahmi, ligado ao Fatah, foi assassinado depois de ter sido seqüestrado por homens encapuzados em Jabaliya, na Faixa de Gaza.

A tensão nas ruas é reflexo da disputa retórica entre líderes rivais. Na primeira manifestação após a convocação antecipada de eleições por Abbas, Haniyeh garantiu ontem que o Hamas vai boicotar a votação. ¿O governo palestino rejeita a convocação porque não é constitucional e pode levar a um grande tumulto nos territórios palestinos.¿

Antes do anúncio da trégua, Abbas javia indicado que seguiria adiante com o processo eleitoral para a escolha de um novo presidente e um novo primeiro-ministro. Ele se reuniu ontem com a Comissão Eleitoral Central em Ramallah, na Cisjordânia, para tentar definir uma data para a votação.