Título: Repórter do 'Estado' recebe prêmio
Autor: Veríssimo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/11/2006, Economia, p. B4
O repórter Sérgio Gobetti, da sucursal de Brasília do Estado, foi um dos vencedores do 11º Prêmio Tesouro Nacional de monografias, o mais prestigioso concedido a economistas da área de finanças públicas, com o trabalho 'Estimativa dos Investimentos Públicos - Um Novo Modelo de Análise da Execução Orçamentária Aplicado às Contas Nacionais'. O trabalho acadêmico teve origem em uma série de reportagens publicadas no Estado este ano, que provocaram polêmica com o governo ao mostrar que a forma de contabilização do Tesouro Nacional estava 'inflando' os valores do investimento público. A superestimativa chega a R$ 15 bilhões nos últimos 11 anos.
Além de jornalista, Gobetti é mestre e doutorando em Economia pela Universidade de Brasília (UnB). Ele conquistou o prêmio como economista, mas a monografia foi elaborada a partir da reportagem 'Planalto ajeita números e infla investimento', publicada no Estado no dia 23 de janeiro. Ela mostrava que o Tesouro havia contabilizado como feitos investimentos que só estavam no papel.
A polêmica foi retomada em julho, quando o Ministério da Fazenda divulgou um estudo informando que os investimentos, desde o início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, haviam sido de R$ 35,3 bilhões - quando, na verdade, os gastos foram de R$ 26,8 bilhões, segundo mostravam os dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi).
Esse problema ocorre, segundo Gobetti, porque a cada fim de ano o Tesouro Nacional faz um procedimento chamado liquidação forçada, no qual classifica como realizadas todas as despesas em andamento, tenham sido elas efetivamente concluídas ou não. Com isso, são dadas como feitas obras que estão só no papel - e não necessariamente serão realizadas.
Essa segunda reportagem criou uma 'saia justa' com o Ministério da Fazenda. O secretário do Tesouro, Carlos Kawall, enviou carta ao Estado informando que a metodologia utilizada pelo órgão tem respaldo na lei. Os técnicos do Tesouro elaboraram uma nota técnica com a mesma informação e a disponibilizaram na internet. Gobetti foi convidado para uma conversa com o secretário e sua equipe.
Independentemente da questão legal, diz Gobetti em seu trabalho, o procedimento usado pelo governo desde 1986 cria um problema nas Contas Nacionais calculadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao não depurar os dados, o IBGE teria superestimado o investimento público em pelo menos R$ 6,6 bilhões.
'O trabalho comprova que o problema na contabilidade do governo vinha afetando as contas nacionais, porque levava o IBGE a superestimar a real formação bruta de capital fixo da administração pública', afirma Gobetti. Em sua monografia, ele propõe um novo modelo para calcular o impacto do investimento público na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF).
Segundo o levantamento realizado por Gobetti, o sistema contábil do governo federal registrou um volume de investimentos de R$ 102,7 bilhões entre 1995 e 2005. No entanto, o valor efetivamente realizado seria de R$ 87,7 bilhões, uma diferença de R$ 15 bilhões. Nesse valor, cerca de R$ 8 bilhões se referem a investimentos de Estados e municípios financiados por recursos federais, e R$ 6,6 bilhões executados diretamente pela União.
Essa diferença tão grande derruba o argumento dos técnicos do Tesouro Nacional de que, no longo prazo, a distorção gerada pela 'liquidação forçada' desapareceria. Para Gobetti, esse raciocínio era válido até 2001, quando se aprofundou o aperto fiscal. Até então, o investimento que não fosse realizado em um ano acabaria acontecendo no ano seguinte.
Porém, em tempos de dinheiro curto, o que não é feito em um ano corre sério risco de ser cancelado. Por isso, a distorção não desaparece mais. 'Não é um problema do governo A ou B, é um problema antigo.'