Título: 'Bondades' ajudam mais ao governo
Autor: Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/09/2006, Economia, p. B7

Apesar das desonerações de impostos dos últimos anos, alardeadas pelo governo, o saldo das medidas tributárias adotadas na gestão Lula ainda é negativo para o contribuinte. Dados da Receita Federal obtidos pelo Estado mostram que, entre elevações e reduções de tributos desde 2003, o governo ainda está com lucro de R$ 3,6 bilhões. As medidas que provocaram aumento de carga tributária renderam R$ 26,4 bilhões, enquanto as desonerações somaram R$ 22,8 bilhões.

Entre as medidas que aumentaram arrecadação, a mais importante foi a incidência do PIS/Cofins sobre produtos importados. Aprovada em abril de 2004, rendeu R$ 14,9 bilhões a mais aos cofres do governo.

Pelo lado da redução de tributos, a decisão de maior impacto foi a chamada MP do Bem, aprovada no segundo semestre de 2005, que desonerou investimentos, deu incentivos ao setor exportador e à inovação tecnológica e aumentou as faixas do Simples, o imposto das micro e pequenas empresas. O ganho do contribuinte com essa medida foi de R$ 5,3 bilhões, a maior parte prevista para este ano.

No governo Lula, a arrecadação administrada pela Receita Federal deve subir R$ 134 bilhões (de R$ 228,3 bilhões em 2002 para R$ 362,3 bilhões em 2006), conforme estima a proposta orçamentária para 2007, atingindo 17,24% do PIB.

Em 2007, deverão entrar R$ 400,3 bilhões nos cofres do governo. A carga tributária total da União, que inclui itens como receitas da Previdência e recebimento de royalties terá passado, no período, de 24,9% para 26,14% do PIB (dado estimado para 2006). O governo, porém, tem dito que o aumento na arrecadação é provocado por fatores como maior eficiência na cobrança de tributos, crescimento econômico e maior lucratividade das empresas.

A Receita e o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega sempre destacam que só pode ser considerado aumento de carga o que representa avanço adicional do Fisco sobre o bolso do contribuinte. O aumento líquido de arrecadação em decorrência de novas legislações, portanto, é o que a própria Receita admite ser aumento da carga.

Para o economista da MB Associados, Sérgio Vale, o resultado líquido das medidas tributárias não surpreende, tendo em vista o aumento dos gastos públicos. Segundo ele, tanto elevação de impostos no início do governo como desonerações a partir de 2004 foram feitas de forma a não haver perda de arrecadação global, dado o quadro de aumento nas despesas.

"Não vejo movimento do governo no sentido de redução dos gastos e, sem algo mais efetivo nesse sentido, a conta dos impostos não vai reverter o sinal", disse. "O pior é que o governo retira recursos da sociedade e gasta de maneira ineficiente. A qualidade do gasto é péssima."

A tributarista Raquel Santos, da L.O. Baptista Advogados, concorda que o constante aumento de gastos públicos leva a uma postura conservadora do governo na gestão tributária. Para cobrir o crescimento das despesas, o governo atinge grande massa de contribuintes com as medidas de elevação de carga tributária, enquanto nas desonerações atua de modo mais "seletivo e parcimonioso."

Entre as medidas de aumento de arrecadação, a segunda mais importante foi a lei que eliminou a cumulatividade da Cofins. Considerando outras alterações tributárias incluídas, ela rendeu, em dois anos, R$ 6,1 bilhões para o caixa federal. Outra mudança importante foi a elevação da base de cálculo da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) de 12% para 32% nas empresas de serviço. O ganho do tesouro foi de R$ 5,4 bilhões.

Raquel critica a forma como foi feito o fim da cumulatividade do PIS/Cofins. Antes, o tributo incidia em cascata nas várias fases da cadeia produtiva e tinha alíquota pequena. O governo criou mecanismo que transfere a tributação para a etapa final, mas elevou a alíquota de 3,65% para 9,25%.

Raquel ressaltou que o setor de serviços, que representa a maior parte da economia, foi o que mais sentiu o peso da voracidade fiscal do governo, já que não conseguiu compensar o aumento do tributo por trabalhar com poucos insumos e usar mão-de-obra de forma intensiva.

O impacto de medidas como essa sobre o bolso do consumidor é claro. Segundo o presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales, o fim da cumulatividade e a elevação do PIS/Cofins onerou o setor elétrico e provocou aumento de 2% nas contas de luz. "O problema é que eles aumentaram muito a alíquota do tributo, com um impacto grande no setor elétrico."

Na lista das bondades do governo, a segunda medida de maior impacto em favor do contribuinte foi a redução para zero de PIS/Cofins para vendas à agroindústria e também sobre arroz, feijão e farinha de mandioca, com impacto de R$ 3,6 bilhões em 2004 e 2005. Também teve efeito significativo a concessão de incentivos para o setor de bens de capital e a redução para zero do PIS/Cofins sobre farinha de milho e leite, com perda estimada de receita de R$ 2,7 bilhões.

Outras medidas importantes foram os dois reajustes na tabela do IRPF, que somaram R$ 4,4 bilhões a menos na arrecadação do governo em 2005 e 2006 e as reduções de IPI para bens de capital (R$ 1,3 bilhão), construção civil (R$ 1,1 bilhão) e diminuição de tarifas de importação (R$ 900 milhões).