Título: Câmara ameniza regras sobre produtos transgênicos
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/12/2006, Vida&, p. A24

A Câmara dos Deputados aprovou ontem a legalização do comércio de algodão transgênico irregularmente plantado no País e a flexibilização das regras para aprovação comercial de organismos geneticamente modificados (OGMs).

O resultado representa duas derrotas para o Ministério do Meio Ambiente (MMA) em apenas um projeto. As medidas vieram de 'contrabando' no relatório preparado pelo deputado Paulo Pimenta (PT-RS) sobre uma Medida Provisória que trazia regras para regulamentar a distância mínima entre uma plantação de transgênicos e uma unidade de conservação ambiental - a chamada zona de amortecimento.

Na Câmara, porém, o texto sofreu as duas alterações. Além da liberação do algodão, foi alterado o quórum mínimo para a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovar a liberação comercial de transgênicos, de 18 votos para 14 dos 27 integrantes.

O relatório de Pimenta teve uma vitória folgada: 247 votos favoráveis e 103 contrários. O projeto agora será votado no plenário do Senado. Se não houver alterações, segue para sanção presidencial.

O secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Capobianco, procurou não demonstrar abatimento. 'Vamos tentar reverter esse resultado no Senado', afirmou.

Integrantes do ministério contam ainda com o compromisso firmado por integrantes do governo de que eventuais alterações ao texto seriam vetadas pelo presidente Lula. Capobianco, porém, preferiu não antecipar o encaminhamento. 'A decisão é do presidente', afirmou, cauteloso.

A votação da MP durou boa parte da tarde de ontem. O texto do deputado Paulo Pimenta primeiro foi aprovado simbolicamente. Mas, diante do pedido do líder do PT, Henrique Fontana (RS), foi realizada também a votação nominal. Apenas o PT, PSOL, PC do B e PV foram contrários ao texto de Pimenta. O restante dos partidos governistas votaram a favor do projeto.

No plenário, circulava a informação de que o governo havia orientado parlamentares a votarem pela manutenção do texto de Pimenta. Esta traição velada não é admitida formalmente por Capobianco. Parlamentares e integrantes de outros ministérios, porém, desde a semana passada afirmam que o governo trabalharia informalmente pela aprovação das mudanças trazidas pelo relator.

A estratégia representaria uma forma de a Casa Civil tirar da gaveta seu projeto para redução do quórum da CTNBio - considerado excessivo e injusto pelo setor produtivo e por cientistas.

REAÇÕES

A diretora-executiva do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), Alda Lerayer, comemorou a alteração de quórum da CTNBio. 'Não era justo que o poder de veto de alguns tivesse mais força do que o voto de outros', comentou. Alda acrescentou que a CTNBio é um colegiado de cientistas e que as decisões políticas cabem ao conselho de ministros. 'Mas acabou virando um conselho político e ideológico', comentou.

Ambientalistas, por sua vez, acusam a MP de representar ameaça às unidades de conservação. Ela reduz a distância mínima entre plantações de transgênicos e unidades de conservação. A soja transgênica, que deveria ser plantada a uma distância mínima de 10 km, com a nova regra pode ser plantada a 500 metros da unidade. 'Se transgênicos são liberados para plantio em todo o País, por que não preservar pelo menos as unidades de conservação?', questionou Gabriela Vuolo, do Greenpeace. Ela observa ainda que a plantação pode fragilizar as unidades pelo uso de agrotóxicos e aumento da atividade.

Ambientalistas também criticaram a 'legalização' dos 150 mil hectares de algodão irregularmente plantado no País. 'É a tática do fato consumado, como ocorreu com a soja', disse Gabriela.