Título: O desperdício e a reciclagem
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/09/2006, Notas e Informações, p. A3

Há cinco anos, o Brasil é líder mundial na reciclagem de alumínio. Em 2005, o índice de reaproveitamento do material chegou a 96,2%, o que representou 127,6 mil toneladas de latas de alumínio recicladas (26 milhões por dia). No ranking da reciclagem, o Japão ficou em segundo lugar com 91,7% e os Estados Unidos e a Europa empataram, em terceiro lugar, com 52%. Também na reciclagem de papelão e plástico, o Brasil atinge níveis de países desenvolvidos - 79% e 48%, respectivamente.

Esses índices, porém, se diluem quando se considera o reaproveitamento do lixo urbano, que chega a apenas 3%. De todo o lixo coletado no País, apenas 10% são reciclados, em média. O desperdício no Brasil é considerado um dos maiores do mundo.

O setor de reciclagem movimentou, em 2005, R$ 7 bilhões e as estimativas de crescimento são otimistas. O Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre) projeta, para 2010, índice de 20% na transformação do lixo coletado no Brasil. Para 2015, a taxa deverá atingir 30%, o que colocaria o País no mesmo patamar dos países desenvolvidos.

Para isso, será preciso adotar um conjunto de medidas que favoreçam o desenvolvimento da educação ambiental, a geração de emprego e renda e a formalização de boa parte das empresas do ramo.

As prefeituras, por exemplo, têm a maior responsabilidade pela coleta e destinação do lixo, mas, em geral, são omissas diante da necessidade de instituir a coleta seletiva. Em todo o País, apenas 327 municípios oferecem esse sistema à população.

O programa de coleta seletiva do Município de São Paulo permite a transformação de 2,2 mil toneladas de lixo mensalmente, o equivalente a pouco mais de 1% das mais de 200 mil toneladas de lixo produzidas na cidade. Durante décadas, a Prefeitura ensaiou a instalação do sistema, mas avançou muito pouco por causa da pressão das empresas prestadoras de serviço que sempre resistiram à idéia de investir nesse tipo de coleta.

Diante da omissão do poder público, cresceu uma rede auto-administrada, formada por parcela da população carente, que encontrou na reciclagem uma alternativa de renda. E agora que a Prefeitura manifesta expressamente a intenção de ampliar a coleta seletiva, há grandes dificuldades para conciliar os interesses da administração municipal com os das cooperativas, acostumadas a seguir as próprias regras.

Em todo o Brasil, a inércia do governo deixou sem o devido controle um setor que hoje reúne 4,5 mil empreendimentos de reciclagem. Desses, menos de 3 mil são regularizados. É um setor que precisa de formalização urgente. Afinal, a importância econômica da reciclagem cresce a cada dia.

No Japão, onde o reaproveitamento não é obrigatório, entre 2004 e 2005 houve um aumento de 5,6% do índice de reciclagem de latas de alumínio. Os Estados Unidos melhoraram em 1% seu desempenho na reciclagem. Nos países da União Européia, o reaproveitamento é obrigatório.

A reutilização de materiais pela indústria é fenômeno mundial. A China, um dos maiores consumidores mundiais de sucata, em 2005, importou, somente dos Estados Unidos, mais de 7 milhões de toneladas de papel e mais de 8 milhões de toneladas de sucata de plástico. Os americanos também exportaram para a Índia total superior a 2 milhões de toneladas de sucata de materiais ferrosos.

Além do estímulo à consciência ecológica, a reciclagem traz ganhos sociais para os países. No Brasil, a coleta de latas de alumínio promove a geração de emprego e renda para mais de 160 mil pessoas. Somente a etapa de coleta, que se resume à compra das latas usadas, injeta anualmente R$ 490 milhões na economia nacional.

A exploração dos recursos naturais também se reduz com a reciclagem. Em 2005, o reaproveitamento das latas de alumínio permitiu economia de 1.800 GWh/ano, o que representa 0,5% da energia elétrica gerada no País e o suficiente para abastecer pelo período de 12 meses uma cidade de 1 milhão de habitantes.