Título: Argentinos ameaçam radicalizar protestos
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/12/2006, Economia, p. B7

Líderes da Assembléia Popular de Gualeguaychú, na província argentina de Entre Ríos, anunciaram que vão radicalizar as manifestações contra a instalação de fábricas de celulose no lado uruguaio da fronteira.

A radicalização incluirá piquetes no Porto de Buenos Aires para impedir o trânsito dos ferry boats que ligam a capital argentina ao Uruguai. A Assembléia é a protagonista principal dos protestos que há mais de um ano e meio causam a mais persistente e intensa crise diplomática entre a Argentina e o Uruguai desde 1955.

Os manifestantes argentinos protestam contra a instalação da fábrica da empresa finlandesa Botnia, que está sendo construída a todo vapor no município uruguaio de Fray Bentos, na margem do rio Uruguai, que divide os dois países.

Os manifestantes, apoiados em peso pela população de Gualeguaychú (uma cidade de quase 100 mil habitantes) e o presidente Néstor Kirchner, argumentam que a fábrica causará um ¿apocalipse¿ ambiental e ecológico na região. Kirchner - sem um passado de militância ecológica -, por questões eleitorais, apóia os manifestantes. O presidente, nos últimos meses, recorreu à Corte Internacional de Haia e ao Banco Mundial para barrar as obras. No entanto, as tentativas de Kirchner foram infrutíferas, fato que levou os manifestantes a atitudes mais radicais.

O governo argentino está preocupado, pois a Assembléia escapou totalmente de seu controle. Os analistas consideram que o impasse é de difícil resolução, pois o governo não está disposto a reprimir os piqueteiros - formados por um amplo leque social de Gualeguaychú, entre eles grandes fazendeiros, comerciantes, empresários do setor hoteleiro e operários - mais ainda em um ano eleitoral como 2007, no qual Kirchner ambiciona a reeleição.

Nas últimas quatro semanas, a tensão bilateral aumentou mais ainda, já que a Assembléia está bloqueando uma das três pontes que ligam os dois países. Além disso, prometem continuar com o bloqueio ao longo de todo o verão. As outras duas pontes também seriam bloqueadas de forma intermitente nos próximos meses.

No início deste ano, o bloqueio realizado entre janeiro e março na ponte entre Gualeguaychú e Fray Bentos, impedindo o trânsito de mercadorias e pessoas, causou prejuízos de mais de US$ 400 milhões à modesta economia uruguaia. O turismo uruguaio depende dos turistas argentinos que procuram as praias uruguaias no verão.

O governo do Uruguai, os partidos de oposição e a opinião pública uruguaia defendem a construção. A fábrica da Botnia (de US$ 1,2 bilhão) é o maior investimento privado já feito no país. Os uruguaios consideram que a fábrica, além de ser crucial para a recuperação econômica do país, é fundamental na tentativa de converter o Uruguai numa potência em celulose.