Título: Paulistas estão cedendo espaço
Autor: Assunção, Moacir
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/12/2006, Nacional, p. A7
Partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT assistiu ao longo do ano que termina a queda, por força de diferentes escândalos, de líderes históricos como José Genoino, José Dirceu e Antonio Palocci. Para o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas, isso fez a legenda viver um vácuo de poder e perder quase totalmente sua face paulista, assumindo feição mais nacional e centrada em Estados de pequena expressão econômica, como Acre e Sergipe.
Agora, acredita ele, o partido se vê forçado a formar novos líderes, inclusive pensando na sucessão de Lula. Nesta entrevista, Teixeira analisa os descaminhos do partido e as alternativas possíveis de sobrevivência em um segundo mandato que deve ser marcado pela cessão de pedaços maiores de poder ao aliados. Sua maior aposta é na escolha da ministra Dilma Rousseff como candidata a candidata do partido nas próximas eleições presidenciais.
O que houve com o PT paulista? O PT foi praticamente esfacelado no Estado. Fundadores do PT e lideranças de mais alta expressão caíram por causa da crise. Até mesmo o senador Aloizio Mercadante, que eu via como um sucessor natural do presidente, teve respingos em sua imagem por causa do escândalo do dossiê antitucano. Vale lembrar uma frase do governador eleito de Sergipe, Marcelo Déda, segundo a qual São Paulo já foi a cabeça do partido e hoje é o intestino.
Quem conseguiu sobreviver neste cenário? Sobreviveram a ex-prefeita Marta Suplicy, representante de uma corrente do partido que se autodigladia constantemente, e o senador Eduardo Suplicy, que por sua vez encontra mais apoio na sociedade do que no próprio PT - ele tem vôo próprio e já foi várias vezes ameaçado de punições e até de não ter legenda para sua candidatura ao Senado. Marta, entretanto, ainda é uma liderança regional.
E o que houve com o partido em termos nacionais? Vai governar Estados fora do eixo Sul-Sudeste, como Acre, Pará, Bahia, Sergipe e Piauí. Isso é bom para o partido porque se desconcentra e ganha expressão nacional, mas ao mesmo tempo não traz , do ponto de vista da interlocução com a sociedade, alguém de relevo. O PT foi mal principalmente em São Paulo, Estado de origem dos principais envolvidos nos escândalos recentes.
Hoje, com este novo cenário, quais são os líderes em ascensão no PT? Os novos líderes são políticos do Acre, como Jorge Viana e a ministra Marina Silva, o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, Marcelo Déda e o governador da Bahia, Jaques Wagner. O maior problema deles é exatamente a pequena projeção nacional dos Estados e cidades que representam, embora Marina e Jorge Viana sejam personalidades de alcance internacional, por causa da questão ambiental no seu Estado. O prestígio de Pimentel concentra-se em Belo Horizonte, não em Minas como um todo. São Paulo vai ter que, forçosamente, ceder espaço diante desse novo quadro.
E em termos nacionais, quem desponta como alternativa? Acredito que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, são fortes candidatos a despontar como lideranças nacionais do partido, com grandes pretensões. Dilma veio da luta armada, não tem passado na política tradicional, como cargos no Legislativo, e se saiu bem em missões difíceis que lhe conferiu o presidente. Também dirigiu o ministério que estava nas mãos daquele que, diziam, era o braço direito do presidente, José Dirceu. Dilma foi uma das primeiras a ser confirmada no segundo mandato. Ananias , por seu turno,dirige o setor do governo que é responsável, em grande parte, pelo sucesso eleitoral de Lula, por causa do Bolsa-Família. Ambos estão em posições estratégicas.
Pode-se imaginar que Lula aposte em Dilma para sucedê-lo? Parece que ela está sendo preparada para exercer um cargo de muito relevo no futuro. Acredito que a ministra possa representar, guardadas as proporções, uma saída à Michele Bachelet (presidente do Chile), uma pessoa saída de ambiente distinto da política tradicional, com fama de firmeza, e uma grande surpresa eleitoral. Algo diferente para Lula, como foi a atual presidente chilena para o seu antecessor, Ricardo Lagos, de quem foi ministra da Defesa. Hoje, o PT não tem candidato à sucessão de Lula e busca uma liderança nacional. Está carente nesse processo e há um vácuo que precisa ser ocupado.
Haveria opção fora do partido? Neste caso, talvez o Ciro Gomes (PSB-CE), campeão de votos para o Legislativo. O problema é que ele tem uma língua muito afiada e várias vezes já mordeu a própria língua.