Título: Estudo rastreia toxoplasmose congênita em recém-nascidos
Autor: Kattah, Eduardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/12/2006, Vida&, p. A14

Um estudo que vem sendo desenvolvido por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) servirá de referência para que o Ministério da Saúde possa avaliar, no início do próximo ano, a inclusão definitiva dos exames de detecção da toxoplasmose congênita no chamado teste do pezinho. O exame é capaz de detectar doenças em recém-nascidos por meio de gotinhas de sangue tiradas do calcanhar.

Desde novembro, a toxoplasmose, conhecida também como doença do gato, começou a ser rastreada no Programa Estadual de Triagem Neonatal, o nome do teste do pezinho em Minas. A pediatra e pesquisadora do Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) da UFMG, Gláucia Manzan Queiroz, destaca que as gestantes são mais suscetíveis à contaminação - e a toxoplasmose pode ser transmitida da mãe para o feto durante a gravidez.

¿Entre as infecções que acometem a criança dentro do útero, ela é uma das mais freqüentes e que lesam de forma mais intensa¿, explica. A intenção é que a partir do diagnóstico precoce seja possível evitar seqüelas graves na criança decorrentes da toxoplasmose, como o comprometimento da visão e do sistema nervoso central, prejudicando o desenvolvimento dos recém-nascidos.

O estudo - uma parceria entre o Nupad e a Secretaria de Estado da Saúde - será realizado até abril de 2007. Nesse período de seis meses, deverão ser feitas triagens em cerca de 140 mil crianças nos 853 municípios de Minas. O sangue dos recém-nascidos é coletado entre 5 e 12 dias de vida e enviado para análises, que são feitas em Belo Horizonte. De acordo com o Nupad, é a primeira pesquisa dessa dimensão feita no País.

Um levantamento realizado na capital mineira entre setembro de 2003 e outubro de 2004 identificou um infectado para cada 1,5 mil nascidos. A expectativa é que a incidência no interior do Estado seja maior devido às condições sanitárias deficientes de regiões menos desenvolvidas.

Nos trabalhos preliminares já foram identificados pelo menos sete casos de contaminação. Embora a doença possa causar perda da visão uni ou bilateral e atraso no desenvolvimento da criança, em geral os recém-nascidos não costumam apresentar sintomas, observa Gláucia. ¿Se a criança for tratada no primeiro ano de vida, você tem uma chance importante de impedir que essas lesões ocorram ou de reduzir a intensidade delas, diminuindo as seqüelas¿, afirma ela.

É nisso que confia o casal Maria Aparecida Dias Costa Coelho, de 35 anos, e José Vieira Coelho, de 50, que mora em um distrito da zona rural de Mutum, na região do Vale do Rio Doce. Maria Aparecida diz que tomou um susto quando foi informada de que o terceiro filho, Guilherme Dias Coelho, com pouco mais de um mês de vida, apresentou sintomas. ¿Fiquei tão chocada. Eu não era informada sobre toxoplasmose. Ele parecia tão saudável¿, conta. O menino será submetido a tratamento durante um ano.

SERVIÇO PÚBLICO Em Minas Gerais, o teste do pezinho contempla atualmente exames de quatro doenças genéticas: hipotireoidismo congênito, doença falciforme, fibrose cística e fenilcetonúria. ¿Feito esse estudo epidemiológico, poderemos levar a discussão para o Ministério da Saúde e, quem sabe introduzir, em todo Brasil essa prática¿, disse o secretário estadual da Saúde, Marcelo Gouvêa Teixeira. A identificação da doença no teste do pezinho seria uma medida inovadora em termos de serviço público. ¿No serviço privado, esse teste já está disponível há alguns anos¿, comenta Gláucia.

Segundo ela, no Brasil a prevalência da doença entre as mulheres é muito elevada. ¿Temos uma proporção que varia de 20% a 40% de mulheres em idade fértil que são suscetíveis. Isso num país em que as chances de infecção são muito elevadas, devido ao clima tropical, porque o contato do homem com o ambiente é muito freqüente e nem sempre as condições de saneamento são adequadas.¿

No resto do País, o teste do pezinho, normatizado desde 2001, quando o Ministério da Saúde criou o Programa Nacional de Triagem Neonatal, está em fases diferentes de implantação. Em alguns Estados, são feitos o exame da fenilcetonúria e do hipotireoidismo congênito. Outros já incluem a anemia. Os mais adiantados têm ainda a fibrose cística.

CONTAMINAÇÃO A doença é causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, cujo hospedeiro definitivo é o gato. Os ovos do parasita são eliminados pelas fezes do animal e a transmissão para o ser humano se dá principalmente pela contaminação do solo e da água.

Na natureza, o protozoário pode infectar um grande número de mamíferos. O homem pode se contaminar pela ingestão de carne crua ou mal cozida, frutas, verduras e legumes crus, mal lavados ou lavados com água contaminada, além do contato direto com os gatos.