Título: Interesse político tumultua gestão da Eletrobrás
Autor: Barbosa, Alaor
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/12/2006, Economia, p. B7

As informações desencontradas sobre uma eventual reestruturação do grupo Eletrobrás refletem as diferentes visões dos diretores da empresa sobre a holding, que responde por cerca de dois terços da energia elétrica consumida no País. Na quarta-feira, o presidente da estatal, Aloísio Vasconcelos comentou que o governo examina a reestruturação da Eletrobrás, o que levaria até a incorporação das empresas regionais (Furnas/Sudeste, Chesf/Nordeste, Eletronorte/Norte e Eletrosul/Sul) por parte da holding, formando o que alguns técnicos da estatal denominam de ¿Petrobrás do setor elétrico¿. Ontem, a empresa retificou observações de Vasconcelos, em nota encaminhada à Bovespa pelo diretor-financeiro, José Drummond Saraiva.

Não foi a primeira vez em que as divergências entre Vasconcelos e Drummond se tornaram públicas. Técnicos da estatal testemunharam discussões acaloradas em reuniões da diretoria. Um dos pontos recentes de discórdia refere-se à distribuição de resultados. Analistas estão projetando forte recuperação nos lucros este ano e Vasconcelos defendeu a distribuição de salários extras aos funcionários, sob a forma de participação nos resultados. Essa medida, porém, foi vetada pelo diretor-financeiro, funcionário de carreira da estatal.

Embora milite no setor elétrico há mais de 20 anos, Vasconcelos não faz parte dos quadros da estatal. Ele foi indicado pelo PMDB, em substituição a Silas Rondeau, quando este foi guindado ao Ministério de Minas e Energia. Vasconcelos fez carreira na Cemig, estatal controlada pelo governo mineiro e apontada como modelo de eficiência no setor. Outro ponto de discordância é o up grade dos papéis na Bolsa de Nova York, para ADR nível 2. Conduzido por Drummond, o processo está atrasado e Vasconcelos se disse ¿frustrado¿ por não concluir a migração em sua gestão.

As divergências na diretoria da Eletrobrás não se resumem a desencontros entre Vasconcelos e Drummond. A diretoria de Engenharia, responsável pelos investimentos, é ocupada por Valter Cardeal, com ligações diretas com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Técnicos do setor elétrico testemunham que Cardeal resolve questões de interesse da Eletrobrás diretamente com Dilma, sem seguir o caminho normal, que seria através de Vasconcelos ou mesmo do ministro Silas Rondeau.

A diretora de administração, Aracilba Alves da Rocha, por sua vez, foi indicada pelo senador Ney Suassuna (PMDB-PB). Como Suassuna não se reelegeu, previa-se que Aracilba perderia poderes na estatal, mas na quarta-feira ela deu entrevistas anunciando que ocupará a presidência da empresa a partir de janeiro, já que Vasconcelos deverá sair.

Além das divergências entre diretores, não há consenso no setor sobre o papel da Eletrobrás na expansão do setor. Embora ainda líder, a estatal perdeu terreno nos últimos dez anos com o processo de privatização. As usinas da região Sul foram vendidas e a empresa foi proibida de participar das licitações do setor elétrico. O esvaziamento da estatal foi estancado no governo Lula, quando a empresa e suas subsidiárias voltaram a ganhar espaço nos leilões do setor.