Título: Ceticismo com pacote domina o mercado
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/12/2006, Economia, p. B4

O pacote econômico para o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é aguardado com ceticismo por economistas de bancos e consultorias. A falta de medidas mais contundentes para conter as despesas públicas no curto prazo é a principal causa.

'Os anúncios estão desencontrados e falta um pronunciamento oficial, mas os sinais até agora são ruins', resumiu o economista Joel Bogdanski, do Banco Itaú. 'O único ponto positivo era o redutor dos gastos públicos, que, aparentemente, foi abandonado', disse Guilherme Loureiro, da Tendências Consultoria Integrada, referindo-se ao mecanismo que obrigaria as despesas a cair 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir de 2008.

Pelo lado das 'bondades', já está claro que o governo vai cortar impostos para investimentos e fortalecer a infra-estrutura e a construção civil. No total, essas medidas deverão custar R$ 12 bilhões ao cofre federal.

Pelo lado das 'maldades', por enquanto, não há sinais de forte contenção de gastos. O governo pretende propor um limite para o crescimento dos salários no serviço público, que passaria a ser equivalente à inflação acrescida de aumento real de 1,5%. Mas essa proposta precisaria passar pelo Congresso, que se auto-concedeu um aumento de 91%.

Já se discutiu a possibilidade de limitar os gastos com saúde, mas a decisão foi adiada para 2007. A reforma da Previdência, que a maioria dos analistas considera crucial para indicar que as contas públicas continuarão equilibradas, também ficou para o ano que vem.

É exatamente isso que tem deixado os especialistas em alerta. A sensação é que falta ao governo disposição para frear a gastança. 'Faltam sinais mais claros de que o governo não vai continuar gastando dessa forma se quiser investir mais', disse Loureiro.

Ele achou preocupante o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ter admitido que será difícil ao governo fixar um salário mínimo menor que R$ 375,00 em 2005. 'Era para dizer que a regra é clara e o mínimo tem de ser de R$ 367,00', frisou.

Se fosse aplicada a regra fixada pelo Congresso, de aumentar o mínimo pela inflação acrescida da expansão do PIB per capita, o valor seria R$ 367,00. Mas o próprio governo propôs R$ 375,00, com base em sua estimativa otimista (e errada) de que o PIB cresceria 4% este ano. A tendência é que o crescimento fique abaixo de 3%, mas agora ficou politicamente difícil cortar o valor do mínimo.

'Estamos muito preocupados com a evolução das contas públicas e avaliamos que há risco sério para os próximos anos', disse Bogdanski. 'O ano de 2007 dará um sinal definitivo de como será o governo Lula no segundo mandato. Nos últimos quatro anos, a administração fiscal não foi de boa qualidade, mas esperamos que o governo entenda que não há alternativa senão cortar gastos.'

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves, tem posição mais moderada. 'Não adianta esperarmos reformas tributária e da Previdência porque elas não têm patrocinador', disse. 'O que está sendo preparado pelo governo é um remendo, mas é com remendos que, às vezes, a gente sai do buraco.'

Ele aposta que o fato de Lula não ter um sucessor à vista facilitará um entendimento com a oposição, abrindo caminho para, por exemplo, reduzir o peso do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre o setor produtivo.

O entendimento com governadores é outro fator que preocupa Loureiro. Ele acha positivo um acordo em torno da reforma tributária. 'A questão é quanto isso vai custar', disse. Os sinais, novamente, não são alvissareiros. Existe pressão para que o Tesouro reveja as condições de financiamento das dívidas de Estados e municípios, que deverá significar menos juros para governadores e prefeitos, aumentando a conta para o cofre federal.