Título: Irã não cede sobre questão nuclear
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Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2006, Internacional, p. A17
O Irã está de novo diante da ameaça de sanções internacionais por causa de seu programa nuclear. Ontem à meia-noite expirou o prazo dado pelo Conselho de Segurança da ONU para que o país suspendesse seu programa de enriquecimento de urânio, sem que as autoridades iranianas voltassem atrás na sua negativa.
Ao mesmo tempo, um relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) - órgão vinculado à ONU e com sede em Viena - aprofundou ontem as suspeitas de que o Irã tenha planos secretos de fabricar armas atômicas.
Inspetores da AIEA confirmaram que o Irã continua a produzir urânio enriquecido em níveis baixos, adequados para uso em reatores nucleares e a produção de energia elétrica. Também assinalaram que o Irã limitou seu acesso a algumas instalações, impedindo-os de verificar a afirmação oficial de que seu programa nuclear tem objetivos pacíficos - basicamente, a produção de energia nuclear.
Mas o mesmo relatório também reafirma que no ano passado foram encontrados em instalações nucleares iranianas traços desse minério altamente purificado, que pode ser usado na fabricação de armamento.
Pouco depois da divulgação do informe da AIEA, os EUA anunciaram que estão preparados para pressionar no Conselho de Segurança da ONU pela aprovação de uma resolução impondo sanções contra o Irã. O presidente americano, George W. Bush, afirmou ontem que o Irã tem de pagar um preço por desafiar o Conselho (ler mais na página A14).
Antes disso, contudo, os EUA vão esperar os resultados de uma nova rodada de negociações entre o governo iraniano e a União Européia, prevista para a semana que vem, possivelmente na terça-feira, em Berlim. Hoje chanceleres europeus discutirão, num encontro na Finlândia, o que fazer em relação ao desafio do Irã. E na quarta-feira haverá uma reunião dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança (Rússia, China, EUA, França e Grã-Bretanha),e a Alemanha.
Nada indica, porém, que o Irã pretenda ceder à pressão. Na semana passada o país respondeu com evasivas a um pacote de benefícios econômicos e comerciais oferecidos pelas seis potências em troca da desistência de enriquecer urânio. Os incentivos incluíam proposta de cooperação na produção de energia nuclear para uso pacífico e o levantamento, por parte dos EUA, da proibição de fornecimento de peças e aviões ao Irã pela Boeing. Os EUA cortaram relações diplomáticas com o Irã em 1980, depois da Revolução Islâmica, por isso a antiga frota de Boeings do país está sucateada.
Ontem o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, qualificou os EUA de "tiranos", repetiu que o país não se deixará intimidar e que tem o direito de dominar todo o ciclo nuclear (ver explicação no quadro ao lado). Funcionários do governo declararam que o país é capaz de suportar qualquer castigo imposto pelo Conselho.
Apesar de ser o quarto maior produtor mundial de petróleo - cujos preços bateram recordes sucessivos este ano -, o Irã tem uma economia pouco desenvolvida e seria prejudicado por sanções comerciais e econômicas. Mas o governo iraniano parece confiar no apoio da China e Rússia, que têm poder de veto no Conselho de Segurança e já deixaram claro sua relutância em aprovar medidas punitivas.
PROBLEMAS TÉCNICOS
O Irã parece estar encontrando dificuldades técnicas para avançar no processo de enriquecimento de urânio, admitiram autoridades e peritos americanos, que fazem uma ressalva: isso não muda o fato de que o país tem ambições de dominar amplamente a energia nuclear e esteja se empenhando para isso.
O ex-inspetor de armas da ONU, David Albright, disse acreditar que o Irã obteve "progresso limitado" em sua usina de enriquecimento de urânio de Natanz. Os técnicos só teriam conseguido instalar e operar um número de centrífugas - usadas para o enriquecimento de urânio - bem menor do que o planejado. Ele não descarta a hipótese de que o governo esteja adiando o desenvolvimento do processo enquanto joga no plano diplomático.