Título: País depende da bonança externa
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/12/2006, Economia, p. B1

O Banco Central (BC) continuará solitário em 2007 na tarefa de controlar a inflação e terá de contar com a sorte de o cenário internacional permanecer, como nos últimos anos, extraordinariamente positivo para países emergentes como o Brasil.

O BC terá a seu favor também a própria superdose de juros que aplicou à economia em 2004 e 2005, que jogou a inflação para cerca de 3%, bem abaixo do centro da meta, que é de 4,5%.

Por outro lado, já está claro que a política fiscal não vai dar suporte à política monetária em 2007. Com o anúncio do novo salário mínimo de R$ 380, de diversas bondades fiscais e da disposição do governo de usar o Projeto Piloto de Investimentos (PPI) para reduzir o superávit primário no próximo ano, as indicações são de que a política fiscal em 2007 não vai ajudar o trabalho do BC.

¿O presidente Lula parece estar com uma agenda minimalista, fazendo muito pouco para resolver os problemas que todos sabem que existem, inclusive o governo¿, diz o economista José Alexandre Scheinkman, da Universidade de Princeton.

A visão de boa parte dos analistas é de que uma política fiscal mais rigorosa, que mantenha o superávit primário e faça cair as despesas correntes como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) já em 2007, abriria espaço para a queda mais acentuada dos juros, sem pôr a inflação em risco.

Alexandre Schwartsman, economista-chefe do ABN Amro na América Latina e ex-diretor do BC, explica que esse efeito ocorre por duas vias: uma direta, pela contenção da demanda derivada dos gastos do governo, e outra indireta, já que menos despesas correntes significam mais investimento público ou menor carga tributária, que incentiva o investimento privado. O investimento, por sua vez, garante que a oferta vai acompanhar o crescimento da demanda, evitando pressões sobre os preços.

O governo, porém, parece cada vez mais confiante de que a sustentação que a economia internacional vem dando à brasileira torna dispensáveis esforços maiores na área fiscal e na agenda de reformas. E as expectativas do mercado estão cada vez mais confortáveis para a aposta do governo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o mundo vai crescer 4,9% no próximo ano, após um avanço de 5,1% projetado para 2006. Nos quatro anos até 2007, a previsão é de uma média de crescimento de 5% - não há nenhum período nem remotamente tão positivo desde o início da década de 80. A inflação global no mesmo período, de 3,7%, é a mais baixa das últimas décadas.

As previsões para o Brasil também estão melhorando, mas analistas alertam para o risco de uma eventual interrupção da bonança externa e também para o fato de que o País pode estar desperdiçando uma chance de derrubar os juros mais rapidamente e acelerar o ritmo de crescimento no longo prazo.