Título: Abusos nas estradas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/09/2006, Notas e Informações, p. A3

O governo federal anunciou investimentos de R$ 1,5 bilhão na instalação de 220 novas balanças em todo o território nacional. Nos 50 mil quilômetros de rodovias federais existentes no País, apenas 15 equipamentos de pesagem de caminhões estão em operação e, ainda assim, em condições precárias de funcionamento. Dados do Centro de Excelência na Engenharia de Transportes (Centran), órgão controlado pelo Exército e pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit), mostram que 77% dos caminhões trafegam com excesso de peso por eixo.

O abuso traz prejuízos de toda ordem ao País. Não há quem ganhe com o excesso de carga. A pavimentação das estradas, que deveria durar entre sete e dez anos, tem vida útil reduzida para dois anos. Hoje, para recuperar a malha rodoviária, o Brasil teria de investir R$ 6 bilhões por ano, até 2011. Além disso, a degradação do asfalto aumenta o número de acidentes e piora a gravidade das ocorrências, desgasta os veículos e atrasa as viagens, aumentando os custos do transporte de carga. As condições ruins de tráfego encarecem em até 30% o frete.

Durante workshop promovido pelo Ministério dos Transportes para discutir o Plano Nacional de Logística dos Transportes, o presidente da seção de cargas da Confederação Nacional dos Transportes, Flávio Benatti, afirmou que o Brasil tem custo excedente anual de R$ 118 bilhões por conta do tempo extra que a produção permanece em estoques, em razão da precariedade da infra-estrutura do transporte.

A instalação das balanças é o primeiro passo definido pelo Centran no Plano Diretor Estratégico Nacional de Pesagem. Em 12 de setembro, será convocada audiência pública e a licitação deverá ser concluída até dezembro. As 220 novas balanças devem entrar em operação em agosto de 2007.

Pelo projeto, os postos servirão como centros completos de atendimento aos caminhoneiros e terão baixa interferência humana no processo de pesagem. Isso reduzirá a possibilidade de caminhoneiros e transportadoras, com propinas ou notas falsas, driblar a fiscalização.

Censores instalados no asfalto detectarão o excesso de peso das carretas. Instantaneamente, faixas eletrônicas informarão se o motorista está liberado para seguir viagem ou se encosta para realizar uma segunda ou terceira pesagem. Constatado o excesso de carga, a multa será expedida e, online, seguirá direto para Brasília e será registrada no prontuário do caminhoneiro.

O principal obstáculo para o combate ao transporte irregular de carga está na legislação falha. Em 1985, o ex-presidente José Sarney promulgou a Lei 7.408, que estabeleceu tolerância de 5% sobre os limites de peso bruto total e peso bruto transmitido por eixo nos veículos de carga. Permitiu, assim, que os caminhões trafegassem com 5% de excesso de carga sem que os motoristas fossem multados.

No decorrer dos anos, esse favorecimento foi sendo ampliado. Em 1998, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) estabeleceu que o peso bruto total por veículo deveria ser de 45 toneladas ou, no máximo, 10 toneladas por eixo. Um ano depois, o conselho ampliou a tolerância de sobrepeso por eixo para 7,5%. No mesmo ano, ainda não satisfeitos, caminhoneiros pressionaram e o Contran baixou a Resolução 104, que proíbe a multa por excesso de peso transmitido por eixo "enquanto não estiverem concluídos os estudos e pesquisas que orientarão a atualização dos limites, bem como não for fixada a metodologia de aferição de peso de veículos".

Assim, se um veículo apresentar excesso de peso bruto, o motorista será multado e parte excedente da carga, retirada. Mas se o excesso for apenas num eixo, a carga deve ser remanejada, sem multa.

Para especialistas, a norma é absurda. Estudos indicam que o pavimento apresenta prejuízo maior com o excesso de carga transmitido por eixo do que pelo peso bruto do veículo. Assim, quem causa maior dano ao patrimônio público não é multado e segue viagem.

A instalação de balanças é necessária, assim como a rigidez na fiscalização. Não menos importante é a atualização da legislação. Ou os infratores seguirão impunes.