Título: 'Dossiê não vai afetar os mercados'
Autor: Chiarini, Adriana e Farid, Jacqueline
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/09/2006, Economia, p. B1

O governo afinou o discurso e se apressou ontem a tentar desvincular da crise política o tranco sofrido pelo mercado financeiro anteontem - parcialmente atenuado ontem - com aumento do dólar, queda na Bolsa de Valores e elevação do risco país. Pela manhã, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista à Rádio CBN, atribuiu a fatores internacionais a tensão no mercado e disse não estar preocupado. À tarde, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, adotou a mesma linha de raciocínio e voltou a apostar em crescimento de 4% este ano, desconsiderando a média das projeções, que aponta para 3%.

Seguindo a tese de que a economia continua imune aos solavancos das denúncias de corrupção envolvendo integrantes de sua campanha à reeleição, o presidente Lula citou a crise política na Hungria e as dúvidas sobre o comportamento das taxas de juros nos Estados Unidos como parte do efeito tensionador no mercado brasileiro. Segundo Lula, o fato de a cotação do dólar ter atingido o maior nível desde 14 de julho é normal em um mercado de câmbio flutuante e até motivo de satisfação para setores que reclamavam da valorização do real.

'Nós temos um dólar que é flutuante. Em outras vezes que o governo americano começou a aumentar um pouquinho a taxa de juros, o nosso dólar subiu. Agora, nós temos uma crise na Hungria; nós temos uma declaração do presidente do Equador de que irá renegociar a questão da dívida; e nós temos uma crise nos Estados Unidos', listou Lula. 'Isso pode ter tido uma interferência na economia brasileira, mas eu posso dizer que a ela nunca esteve tão sólida nestes últimos 30 anos como está agora. Ou seja, essas crises eventuais não nos preocupam.'

Embora reconhecendo que o desempenho do Brasil ainda está abaixo da média da América Latina, o presidente afirmou que 'nenhuma economia está crescendo com a solidez da brasileira'. 'Tivemos que desmanchar a casa, fazer alicerce novo, muito sólido e levantar uma parede. E, agora, posso dizer: nós vamos madeirar essa casa e cobrir e vai ser uma casa sólida.'

Mantega - que deu entrevista no Rio tendo à mesa um Caderno de Economia do Estado com marcações - disse que a volatilidade do mercado nos últimos dias está relacionada à desvalorização de commodities e do petróleo, e ao fato de o Equador querer renegociar a sua dívida externa. Ele afirmou ainda que houve problemas políticos na Polônia e na Hungria, além de sinais de desaquecimento da economia americana.

'Não será dossiê aqui do Brasil que vai afetar os mercados', disse Mantega. Para ele, o presidente Lula terá uma posição 'confortável' após a eleição e mesmo os políticos de partidos que estão na oposição poderão apoiar projetos do governo.