Título: O tipo de ajuda que Serra pediu
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/01/2007, Notas e Informações, p. A3

Não há muita novidade nas diretrizes que o governador José Serra estabeleceu para seu governo na área de segurança pública. Essa a grande virtude de sua política para o setor. Em vez do envio de tropas da Força Nacional ou do Exército, ele reivindica maior cooperação da Receita Federal e da Polícia Federal e maior agilidade nos repasses do Fundo Nacional de Segurança e do Fundo Penitenciário Nacional.

A primeira medida tem por objetivo a instalação de um eficiente sistema de inteligência que coordene as ações dos órgãos policiais e fiscais federais e estaduais. Apesar de previsto pelo Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que foi lançado por Lula há quatro anos, esse sistema até hoje não foi efetivamente implementado. O objetivo da segunda medida é acabar com os obstáculos que, por razões burocráticas e motivos políticos e partidários, retardaram os repasses das verbas federais para a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo nos últimos quatro anos.

Essas providências simples - porém sensatas e necessárias - no plano estadual são totalmente diferentes das iniciativas que o presidente Lula tem anunciado em matéria de segurança pública, no plano federal. Embora o presidente tenha prometido em seu discurso de posse que dará prioridade ao setor, os recursos a ele destinados pelo Orçamento da União para este ano são menores que os previstos em 2006. Os investimentos do Fundo Nacional de Segurança Pública para 2007, por exemplo, foram reduzidos em 39%, com relação a 2006. No caso do Fundo Penitenciário Nacional, a redução é de 47%. Além do volume de recursos estar muito aquém do necessário, até agora o dinheiro tem sido liberado a conta-gotas, de acordo com os contingenciamentos impostos pela equipe econômica.

A iniciativa mais polêmica foi a criação, em 2004, da Força Nacional. Concebida para socorrer os governos estaduais em situação de descontrole, quando as polícias locais se mostram impotentes para impedir o comprometimento do funcionamento dos serviços essenciais, ela foi utilizada como trunfo político por Lula em 2006, quando a ¿ofereceu¿ ao então governador Geraldo Alckmin, após os ataques do PCC. Na época, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, por diversas vezes afirmou que a Força tinha ¿milhares de homens treinados prontos para agir¿ e que podiam ¿ser chamados a qualquer momento¿.

Hoje se vê que isso não era verdade e que as declarações eram fantasiosas. Como é formada por contingentes de elite das próprias polícias estaduais e para entrar em ação depende de um complicado esquema de convocação, transporte, alojamento, alimentação, equipamentos, assistência administrativa e estratégia, a Força Nacional até agora não passa de uma força virtual. No caso do Rio de Janeiro, os gastos com seu deslocamento e emprego, segundo as estimativas, seriam superiores a R$ 2 milhões por dia.

Além disso, como esses contingentes de elite exercem funções estratégicas, eles deixariam as polícias onde servem desguarnecidas, quando convocados para integrar a Força Nacional, o que é um enorme contra-senso. E há ainda o problema da falta de embasamento jurídico para assegurar a esses homens o exercício da função policial fora de seu Estado de origem e a definição do foro para o julgamento de eventuais crimes por eles cometidos durante seu trabalho em outro local.

Por causa dessas dificuldades, a Força Nacional até hoje só foi convocada três vezes e, assim mesmo, para atuar com tropas reduzidas em Estados pouco populosos, como Espírito Santo e Mato Grosso do Sul. Apesar de no papel contar com mais de 7 mil integrantes, foram mobilizados no máximo cerca de 500 homens, nas oportunidades em que agiu. Ou seja, foram atuações de caráter meramente experimental. É por isso que, embora o governador Sérgio Cabral tenha pedido a presença imediata de um contingente da Força Nacional no Rio de Janeiro há quase dez dias, a tropa até hoje não foi enviada. E, quando os primeiros homens chegarem, eles não irão para as áreas mais problemáticas, limitando-se a ajudar na fiscalização das estradas nas divisas do Rio com São Paulo, Minas e Espírito Santo.

Foi o conhecimento dessa realidade que levou o governador Serra a pedir ao governo federal apenas uma melhor articulação dos órgãos policiais e fiscais e menos entraves burocráticos e políticos nos repasses das verbas a que o Estado de São Paulo tem direito.