Título: Uma boa safra de dólares
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Fonte: O Estado de São Paulo, 07/01/2007, Notas e Informações, p. A3

Com um superávit de US$ 42,73 bilhões, o agronegócio representou 92,7% do saldo do comércio exterior brasileiro do ano passado, segundo os números divulgados na sexta-feira pelo Ministério da Agricultura. Suas exportações, US$ 49,42 bilhões, corresponderam a 35,9% das vendas externas do País. Apesar da crise financeira da agricultura e do câmbio desfavorável, o setor demonstrou, mais uma vez, sua importância para a solidez das contas externas. Internamente, deu mais uma contribuição decisiva para o controle da inflação e para o aumento real do poder de compra dos salários.

Em São Paulo, onde os preços ao consumidor medidos pela Fipe aumentaram apenas 2,55% em 2006 - a menor variação desde 1988 -, o custo da alimentação para as famílias permaneceu praticamente estável, com aumento de 0,06%.

O valor exportado pelo agronegócio aumentou 13,4%, com variação de US$ 5,83 bilhões. As vendas de açúcar e álcool proporcionaram 53% desse acréscimo. Renderam US$ 7,77 bilhões, 65,9% mais que em 2005. Essa variação correspondeu a US$ 3,1 bilhões e resultou da combinação de 6,8% no volume e 55,3% no preço médio.

As exportações do setor sucroalcooleiro ficaram em terceiro lugar, em valor, abaixo das vendas do complexo soja (US$ 9,31 bilhões) e das carnes (US$ 8,64 bilhões). Mas a receita obtida com açúcar e álcool poderá ultrapassar a das vendas de carnes, em 2007, segundo estimativa da Confederação Nacional da Agricultura, apresentada pelo técnico Matheus Zanella. Os preços internacionais do açúcar e do álcool, segundo ele, deverão continuar favoráveis, graças, principalmente, à demanda de combustível limpo.

Apesar das barreiras comerciais nos mercados mais desenvolvidos, o Brasil tem conseguido aumentar as exportações de álcool. A tonelagem vendida aumentou 31,4% entre 2005 e 2006, graças, principalmente, a exportações para os Estados Unidos, o Japão, a Holanda e a Suécia. O etanol brasileiro é o mais barato do mundo e poderá vencer facilmente qualquer competição, em condições de concorrência mais livre.

O governo brasileiro tem trabalhado para derrubar ou diminuir barreiras nos Estados Unidos e na Europa, mas com resultados muito modestos. O Ministério da Agricultura tem conseguido algum apoio político nos Estados Unidos para a abertura do mercado de etanol, mas ainda haverá muita oposição a qualquer afrouxamento do protecionismo. A melhor notícia, por enquanto, deve ser mesmo a decisão da União Européia (UE) de estimular o consumo de etanol para substituir parcialmente os combustíveis fósseis.

Haverá estímulos à produção de álcool, mas, se a demanda crescer como se espera, será necessário importar, admitiu há poucos dias a comissária da UE para Agricultura, Mariann Fischer Boel. Nesse caso, segundo ela, será preciso recorrer à produção brasileira para completar o suprimento do mercado europeu.

Mas é bom não manter ilusões quanto a um ponto: os governos da União Européia tenderão a dar preferência a produtores do Caribe, da África e do Pacífico. Já o fazem, nas compras de açúcar, e deverão manter essa política, se esses países puderem oferecer o álcool. O governo brasileiro tem procurado transferir tecnologia para países dessas áreas. Com isso, segundo alegam as autoridades de Brasília, será mais fácil transformar o etanol numa commodity. Muito mais prático - e mais prudente - seria levar em conta o aumento da demanda, conseqüência praticamente inevitável das políticas ambientais, como já se verifica nas economias mais desenvolvidas.

As vendas de carne bovina também cresceram de forma notável, apesar das barreiras criadas, em vários países, desde o aparecimento de focos de aftosa em Mato Grosso do Sul, em 2005. O volume exportado aumentou 12,4% e o preço médio cresceu 14,1%. O resultado foi um faturamento de US$ 3,92 bilhões, 28,2% maior que o do ano anterior. A demanda de carne é em geral um bom indicador de como evolui a economia mundial, pois é afetada sensivelmente pela variação de renda dos consumidores. Mas o poder de competição do produtor brasileiro deve continuar permitindo o crescimento das vendas, mesmo com algum desaquecimento da economia global.