Título: No vestido, sai o vermelho e entra o amarelo
Autor: Gallucci, Mariângela e Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/01/2007, Nacional, p. A8

Dona Marisa Letícia escolheu um vestido de crepe amarelo - coberto por uma capa de renda de bilro tecida em formato de camélias - para acompanhar o presidente na posse. Cercado até ontem de um mistério digno de segredo de Estado, o modelo deve dividir opiniões - mas pode-se dizer que tudinho nele foi feito de caso pensado.

A cor, por exemplo. ¿Em 2003, ela foi com um vermelho esvoaçante porque a idéia era acompanhar aquele climão do PT chegando ao poder. Agora a história é outra. Aconteceu aquilo tudo e o presidente mesmo disse que foi reeleito com uma vitória pessoal. Escolhemos o amarelo, uma cor popular entre os brasileiros e presente na bandeira nacional para representar esse momento¿, explica Walter Rodrigues, o estilista que vestiu a primeira-dama nas duas cerimônias.

Com um pouco de boa vontade, é possível ver também no material escolhido para o vestido aquilo que os semióticos gostam de chamar de ¿signo¿. Desta vez, a mensagem subliminar é da, digamos, inclusão social. O jardim de camélias entrelaçadas que cobriu os ombros da primeira-dama foi feito ao longo de 20 dias por 30 artesãs da Associação das Rendeiras de Morros da Mariana, uma comunidade de Ilha Grande, a 350 quilômetros de Teresina, no Piauí.

As costureiras se revezaram para deixar o modelo pronto em um tempo curto porque o cerimonial do Planalto demorou para definir os detalhes da posse. ¿Mas valeu. A primeira-dama desfilou em carro aberto mostrando um produto brasileiro, prestigiando o trabalho feito por pessoas simples do Norte do País¿, interpreta Rodrigues.

A bordo de seu vestido-mensagem, a primeira-dama teve por perto ao longo de toda a cerimônia Mariza Alencar, mulher do vice José Alencar, que vestia um tailleur branco aparentemente sem subtexto. Na rampa que leva ao Congresso, encontrou ainda Rita, mulher do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP) - em um vestido lilás - e Verônica, mulher do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) - em um vestido claro. Enquanto o presidente Lula discursava, diante do Palácio do Planalto, ficou de frente para um povo vestido majoritariamente de vermelho PT. Em todas as cenas, o amarelo sobressaiu. ¿A idéia era essa mesmo: colocar uma cor solar naquele cenário de Brasília, com o branco das construções da Esplanada e o verde dos gramados¿, explica Walter Rodrigues.

Alheios à possibilidade de um vestido de uma primeira-dama ser transformado em uma espécie de Parangolé - aquela manta do artista plástico Helio Oiticica, cheia de significados -, restou aos espectadores da festa apenas a faculdade de achar aquilo bonito ou feio. ¿Eu não gostei. Aquelas rendas parecem um fuxico disfarçado e o amarelo é uma cor difícil de usar, caso contrário vira aquele omelete¿, diz o estilista Ronaldo Esper. ¿Sem falar que essa neurose de usar coisas brasileiras é uma piada, porque só existe roupa bonita e feia. A bonita é entendida em qualquer lugar do mundo. E, meu amor, fora do Brasil ninguém vai entender o que é isso que a dona Marisa usou¿, completa ele, um pouco decepcionado por estar de férias e não poder levar a imagem da primeira-dama para o quadro Agulhadas, que apresenta toda semana no Superpop, programa da Rede TV!. ¿Eu ia dizer o seguinte: dona Marisa está parecendo um post-it.¿