Título: Entidades querem levar governo para esquerda
Autor: Paraguassú, Lisandra e Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/12/2006, Nacional, p. A4

Os representantes dos movimentos sociais deixaram claro no encontro de ontem que pretendem fazer força para puxar o governo para a esquerda - apesar de o próprio presidente Lula ter afirmado que atualmente, mais velho, já é de centro. ¿Vamos querer disputar o governo com o capital financeiro e com os setores conservadores¿, disse depois João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST. ¿O presidente pode ter essa posição, mas foi eleito por uma base de esquerda¿, afirmou, referindo-se ao centrismo expresso por Lula.

Por sinal, ontem, depois do encontro, Lula tentou desfazer o mal-estar causado pela declaração de segunda-feira, quando disse que quem é mais velho e permanece de esquerda tem problemas. ¿Eu fiz uma brincadeira¿, afirmou, em entrevista. ¿Lamentavelmente, parece que tem gente no Brasil que não gosta mais de humor, que acha que o humor é pecado.¿

Na reunião da tarde, João Paulo disse que os movimentos sociais querem participar da construção de uma agenda nacional e completou com uma quase ameaça: ¿Caso contrário, o presidente não tenha dúvida de que os movimentos sociais têm força¿.

Lideranças dos movimentos indígena, negro e homossexual aproveitaram o encontro para se queixar do governo e de declarações do próprio Lula. Representante de um grupo de lésbicas reclamou que não teve direito de fazer discurso durante a audiência no Planalto. Das 35 entidades convidadas, apenas algumas, como MST e União Nacional dos Estudantes, puderam se pronunciar.

As lideranças indígenas aproveitaram ao máximo o direito de falar para exigir explicações sobre um discurso em que Lula culpou índios e quilombolas por dificultar a construção de obras de infra-estrutura. ¿A gente quer saber por que o senhor disse que os povos indígenas e os quilombolas são entraves para o crescimento¿, questionou Jecinaldo Saterê Mawé, da Coordenação das Organizações da Amazônia Brasileira.

Lula teria respondido que a mídia deturpou discurso feito por ele em Mato Grosso, segundo relato de Manoel Uilton dos Santos Tuxá, da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo. ¿Precisamos destravar projetos de infra-estrutura em áreas indígenas e quilombolas¿, disse o presidente, retificando seu discurso. ¿Nós dissemos a ele que repudiamos qualquer projeto que comprometa nosso território¿, relatou Tuxá. O presidente disse que os movimentos sociais não têm culpa pelo atraso nas obras. ¿Os entraves estão dentro do governo, que não consegue resolver as questões¿, disse. Lula reclamou da burocracia. ¿Eu tomo uma decisão aqui, mas a decisão não sai¿, queixou-se o presidente. ¿Preciso da compreensão dos movimentos sociais para fazer um destravamento do Estado brasileiro.¿