Título: Régis é exemplo de ineficiência
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2007, Economia, p. B3

Os motoristas não enxergam a placa que anuncia 'uma obra do governo federal', encoberta pelo mato, mas isso não faz diferença. Também quase não se vêem obras ao longo dos 404 quilômetros da Rodovia Régis Bittencourt (BR-116), entre São Paulo e Curitiba. Conhecida como 'rodovia da morte' por causa do alto índice de acidentes, a Régis é considera pelos prefeitos um exemplo da ineficiência do governo federal na administração de rodovias.

O mato alto do canteiro central e das margens foi cortado pela última vez há mais de dois anos, segundo Edson Ferreira da Silva, funcionário de um caldo de cana na beira da estrada. 'Meu patrão paga para roçar aqui na frente, senão os motoristas não vêem a gente.' As placas de sinalização ficam encobertas. São visíveis apenas as que indicam 'pamonha, banana e jaca', pois os vendedores abrem clareiras no matagal. Na pista, os buracos estão se transformando em crateras, sem que a empresa contratada pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit) para o 'tapa-buracos' consiga dar conta do recado.

O problema não é decorrente das últimas chuvas, como provam as faixas de sinalização pintadas dentro das crateras. Nos trechos mais críticos, entre Juquitiba e Juquiá, sobretudo na Serra do Cafezal, em Miracatu, os caminhões trafegam na faixa dos automóveis, menos esburacadas, e acabam multados.

No trecho de 32 km de serra, a pista não foi duplicada e, para quem sobe, não há acostamentos. Os 11 radares que limitam a velocidade a 60 km por hora seriam dispensáveis. Com o excesso de veículos e a freqüente interdição por queda de barreiras, a lentidão e os congestionamentos são constantes.

'Para aplicar multas eles são ligeiros, mas para melhorar a estrada...', reclama Aldo Sartorelli, caminhoneiro de Florianópolis. Ele lembra que há 20 anos se fala em duplicar o trecho da serra, mas o projeto não sai do papel. Sartorelli não acredita que a simples instalação de pedágios vai resolver. 'O governo sempre desvia o dinheiro para outra coisa.'

Josmar Rodrigues, de 26 anos, dono de uma empresa que mantém três caminhões puxando cimento na Régis, conta que as más condições da estrada representam custo adicional de R$ 60 mil por ano. 'Daria para comprar um caminhão.' Segundo ele, fica mais barato pagar pedágio e rodar numa estrada melhor. 'Meus caminhões rodam também na Castelo Branco, e só em combustível a economia é de 10%.'

A Castelo é uma rodovia estadual privatizada e com pedágios. Na Régis, as empresas de transportes são obrigadas a contratar escolta para as cargas. Além dos ladrões, em caso de acidentes o saque é inevitável. Há ainda intenso comércio ilegal nas margens, onde se vende desde bebidas e animais da fauna silvestre até combustível roubado e adulterado. O prefeito de Miracatu, Miyogi Kayo (PSDB), acha que o governo não vai conseguir duplicar o trecho da Serra do Cafezal, onde ocorre a maioria dos acidentes. O município do Vale do Ribeira é cortado pela rodovia.

Kayo tem uma lista de 44 pessoas acidentadas apenas em dezembro, atendidas no pronto-socorro municipal. Entre elas há dois estrangeiros. 'Vou mandar a relação aos governos do Estado e federal e pedir que me ajudem com verbas.' Segundo ele, as vítimas tinham ferimentos graves que exigiram procedimentos caros. A maioria dos acidentes aconteceu na serra.

A duplicação na serra é uma obra cara, diz o prefeito. 'Pelo menos 27 quilômetros exigem pontes e túneis, além da construção de aterros.' Há ainda exigências ambientais, pois a estrada corta área de mata atlântica. Na opinião de Kayo, a duplicação é indispensável e a demora, absurda. 'Essa rodovia transporta grande parte da riqueza do País, mas o problema maior é a vida: quantas pessoas já morreram por aqui?'