Título: Os gastos com precatórios
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2007, Notas e Informações, p. A3

Provenientes das dívidas judiciais que a União, os Estados e os municípios têm de pagar a pessoas físicas e jurídicas, os precatórios sempre foram uma das principais dores de cabeça das autoridades econômicas. Embora ninguém saiba ao certo qual é seu montante, o valor estimado é tão alto que, se todas essas dívidas tivessem de ser pagas num mesmo exercício fiscal, o efeito sobre a economia seria devastador.

No plano federal muitos precatórios datam do tempo da inflação alta, envolvendo processos abertos por cidadãos e empresas com o objetivo de serem ressarcidos por perdas, erros de cálculo, calotes e confiscos promovidos entre 1986 e 1993 pelos Planos Cruzado, Bresser, Verão e Collor. Só a discussão que vem sendo travada no Supremo Tribunal Federal (STF) relativa à substituição do IGP-M pelo IGP-1, ocorrida em 1993, e que aguarda o parecer do relator, ministro Sepúlveda Pertence, pode custar R$ 26,5 bilhões ao Tesouro. Outros precatórios decorrem de ações judiciais impetradas por corporações de servidores públicos com o objetivo de questionar os índices de correção de seus vencimentos e de reivindicar o pagamento de gratificações, abonos e vantagens funcionais.

O primeiro tipo de ação traz para o presente as anormalidades do passado, abrindo caminho para a reindexação da economia e anulando os esforços das autoridades econômicas para institucionalizar o princípio da responsabilidade fiscal. O segundo tipo de ação, apesar de decorrer de pretensões justas e legítimas da parte de alguns servidores, acabou sendo desvirtuado pelos interesses corporativos do funcionalismo, que se vale dos tribunais para tentar multiplicar seus vencimentos. Atualmente, os servidores públicos são os campeões em ações de ressarcimento impetradas contra as diferentes instâncias governamentais.

Nesse quadro, são dignos de atenção os resultados que a Advocacia-Geral da União (AGU) vem obtendo desde que, na metade da década de 90, criou uma equipe especializada para calcular com precisão o valor dos precatórios em que o Executivo é condenado a pagar. O trabalho é realizado pelo Departamento de Cálculos e Perícias, cujos 220 técnicos, só no ano passado, produziram mais de 363 mil planilhas, recomendando a revisão dos cálculos dos precatórios devidos pelo governo.

Treinados em contabilidade, esses peritos procuram identificar os valores superestimados das ações nas quais a União é ré, com o objetivo de impugnar a ordem de pagamento na fase de execução da sentença, procurando conseguir a redução do valor da condenação. Graças a esse cuidado, 442 mil processos judiciais tiveram seus cálculos revistos ao longo dos últimos 12 anos, o que reduziu os gastos do Executivo com precatórios em 62%.

Entre 1995 e 2006, a União foi condenada pelas instâncias superiores do Poder Judiciário a pagar R$ 69,2 bilhões em precatórios. Contudo, graças à atuação do Departamento de Cálculos e Perícias da AGU, o valor efetivamente pago foi de R$ 26,2 bilhões. A economia no valor de R$ 43 bilhões equivale ao total de investimentos previstos pelo Orçamento-Geral da União durante três anos consecutivos. Entre janeiro e novembro de 2006, os técnicos do órgão detectaram erros nos cálculos de 75 mil processos judiciais, o que levou o montante das condenações a sofrer uma redução de R$ 9,22 bilhões para R$ 5,14 bilhões, ou seja, uma economia de R$ 4,08 bilhões. As diferentes corporações de servidores públicos foram responsáveis por 68,5% das ações com cálculos superestimados, em 2006.

O trabalho do Departamento de Cálculos e Perícias da AGU também ajudou, no plano institucional, a pôr fim à tendência do funcionalismo de fazer reivindicações mirabolantes, para depois aceitar um valor justamente arbitrado. O exemplo mais ilustrativo é a ação que os policiais civis de Rondônia moveram contra a União, pedindo R$ 436 milhões a título de gratificação. A AGU contestou as contas, reduziu o pagamento para R$ 160 milhões e o sindicato da categoria não recorreu, o que mostra como era absurda a pretensão original.

O sucesso da AGU com medidas simples e sensatas, como a criação de um Departamento de Cálculos e Perícias, pode tornar a administração pública mais eficiente.