Título: Gás natural e termoeletricidade
Autor: Sauer, Ildo Luis
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2007, Economia, p. B2

A Petrobrás atua com transparência e observância de suas obrigações, sejam elas oriundas da lei ou de contrato. Na sua participação no setor elétrico não poderia ser diferente. Entretanto, em sua atuação como fornecedora de gás natural e proprietária de diversas usinas termoelétricas, têm surgido interpretações equivocadas que necessitam ser esclarecidas.

Por exemplo, usinas termoelétricas sem contratos firmes de gás natural vêm sendo motivo de interpretações divergentes, contrapondo-se o uso termoelétrico ao seu uso industrial. Chega-se a simplificações de que a Petrobrás deveria destinar o gás quase que exclusivamente ao setor térmico, independentemente do interesse deste em compromissos firmes de fornecimento, e que a falta de oferta de gás para qualquer interesse do setor térmico deveria ser rotulada de overbooking. Ora, gás natural no mundo todo - e o Brasil não é exceção - é um mercado de contratos necessários que são feitos para assegurar os elevados investimentos de capital da indústria de petróleo e gás.

Em complemento às usinas termoelétricas disponíveis e com contrato de gás, a parcela não contratada da capacidade das térmicas pode ser despachada à medida que se tornem disponíveis volumes incrementais de gás a custos que permitam o despacho. Mesmo desobrigadas de operar a qualquer momento, e não sendo computadas como energia garantida na modelagem do setor elétrico, tais usinas cumprem papel de backup no sistema. Por exemplo, a redução do suprimento de uma determinada região devida a uma eventual interrupção em linha de transmissão pode ser compensada pelo acionamento desses geradores térmicos.

Esse é o regime Merchant (venda de energia no mercado spot), cujo despacho fica condicionado à disponibilidade de gás natural, que fez parte do modelo original em que as térmicas foram construídas, e cuja aquisição pela Petrobrás não se propôs a uma mudança imediata desse regime. Portanto, para tais térmicas não houve, e não há, obrigação de contratos firmes de fornecimento de gás, conforme previsto na legislação então vigente.

A partir de dezembro de 2005, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), de acordo com a Resolução nº 190, passou a exigir contratos com garantia de suprimento de combustível e punições no caso de falhas. Entretanto, a agência reconheceu a existência de térmicas em operação comercial anterior a essa data com suprimento não firme, determinando ao Operador Nacional do Sistema não considerá-las nos modelos de planejamento da operação do sistema elétrico.

Os elevados investimentos de capital nas térmicas e na produção de gás natural devem assegurar aos investidores o retorno do capital aplicado. A necessidade de ampliação permanente do parque gerador do País requer atenção especial a esse ponto. A Petrobrás vem sinalizando, há algum tempo, aos diversos agentes do setor preocupações sobre os crescentes custos de produção e transporte de gás natural e seus conseqüentes reflexos no preço da energia.

A operação de um mercado que promova investimentos sustentáveis se faz necessária, já que o gás natural, recurso não renovável, demanda investimentos maciços e contínuos em exploração, produção e transporte, que serão superiores a US$ 22 bilhões nos próximos cinco anos, quando considerados apenas os projetos da Petrobrás e de seus parceiros.

O crescimento da oferta de gás natural para geração térmica assegurará o atendimento dos novos contratos de venda já firmados pela companhia dentro do Ambiente de Contratação Regulado (ACR), além de permitir a contratação de novas vendas para aqueles consumidores que optaram pelo Ambiente de Contratação Livre (ACL).

Esta é uma questão que precisa ser resgatada, dado que o debate sobre o gás natural tem desviado a atenção de questões mais relevantes para o setor elétrico, como a regularização dos contratos de importação de energia sem garantia de suprimento e a falta de contratação de longo prazo pelos ¿consumidores livres¿ (cerca de 20% da demanda), para que essa bolha especulativa não se transforme num problema sistêmico.

A expectativa é de que os clientes que optaram pelo mercado livre passem a praticar contratos firmes e de longo prazo, em razão das incertezas naturais dos mercados de curto prazo, criando condições de sustentabilidade para os investimentos no setor energético.

A Petrobrás, como detentora do maior parque termoelétrico do País, está pronta para os novos desafios impostos pelo crescimento do setor energético, investindo somas recordes no setor e sempre atuando alinhada com os interesses nacionais, com a indústria e o poder público, estritamente dentro da lei. Defendemos uma visão construtiva e de longo prazo, que aponte para o futuro e promova o investimento.