Título: 'Homogeneidade só no cemitério', diz Celso Amorim
Autor: Pamplona, Nicola e Komatsu, Alberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/01/2007, Economia, p. B10

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou ontem que as divergências políticas que deram o tom da Cúpula do Mercosul terminada ontem são benéficas e normais em um grupo dessas dimensões. 'Não se pode querer que na América do Sul sejam todos iguais, todos do mesmo partido', disse o ministro, ao fazer um balanço dos resultados do encontro. 'Homogeneidade só existe no cemitério.'

'Acredito que seja saudável ter esse agrupamento de países da América do Sul. Em um primeiro momento pode ter essa efervescência, mas, no seguinte, ele tende à convergência, o que pode facilitar acordos', concordou o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, no final do encontro. Para Amorim, o mais importante é que todos estão comprometidos com a integração do continente 'na base da justiça social e do crescimento econômico'.

Segundo o ministro das Relações Exteriores, o encontro teve importantes avanços, principalmente em relação ao aprofundamento do bloco, que, na sua visão, começa a englobar diferentes setores da sociedade. Como exemplo, ele citou a Cúpula Social do Mercosul, realizada em dezembro, e o encontro de governadores e prefeitos do bloco, que ocorreu esta semana no Rio. 'Estamos passando de uma fase do Mercosul dos governos para o Mercosul dos povos', disse Amorim.

Na avaliação do assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, o Mercosul não é apenas uma 'nação comum', mas uma aliança acima de interesses pessoais ou de projetos políticos dos chefes de Estado dos países membros. Marco Aurélio participou de um café da manhã entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner, da Argentina, na suíte de Lula, no Hotel Copacabana Palace, zona sul do Rio.

'Não estamos construindo uma nação comum. Estamos construindo uma aliança de longa duração que nós queremos que sobreviva ao Lula, ao Kirchner e ao Chávez (Hugo Chávez, da Venezuela)', afirmou Garcia. Essa foi a sua resposta ao ser questionado se durante o café da manhã os dois presidentes teriam demonstrado algum tipo de receio com instabilidades que poderiam ocorrer no Mercosul pelos processos de adesão da Venezuela, que recentemente anunciou estatizações, e da Bolívia, que nacionalizou os setores de petróleo e gás.

De acordo com o assessor, o café da manhã só não foi mais 'doce' porque a maioria dos participantes evitou consumir açúcar. 'Nós entendemos claramente que são decisões de políticas internas que não afetarão.'

Garcia não acredita que a Argentina tenha algum receio na entrada da Venezuela no Mercosul. 'Essa versão é da imprensa brasileira, a de que a Venezuela gera instabilidade. Se você ver a imprensa internacional, constata o contrário, que os últimos acontecimentos na Venezuela não geraram instabilidade', disse Garcia. Na opinião do assessor, já se foi a época na qual os investidores pensavam que Buenos Aires era a capital do Brasil. 'Espero que eles (investidores) não estejam pensando que a capital do Brasil é Caracas.'