Título: Cargo permite substituir presidente. Ou ameaçá-lo
Autor: Domingos, João e Leal, Luciana Nunes
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2007, Nacional, p. A6

O presidente da Câmara tem imenso poder político. Pode facilitar a vida do presidente da República ou cercar o Palácio do Planalto de problemas. Para começar, o ocupante do cargo é o segundo na linha sucessória da República, atrás apenas do vice-presidente - fato que ganha importância diante dos freqüentes problemas de saúde de José Alencar. Mas não é só isso. Cabe ao presidente da Câmara ordenar a pauta de votações, respeitando ou contrariando os interesses do governo. Cabe a ele também aceitar ou rejeitar preliminarmente os pedidos de impeachment do chefe do Executivo quando acusado de crime de responsabilidade.

O pedido de impeachment mais conhecido do País foi o de Fernando Collor, autorizado pela Câmara em 29 de setembro de 1992, por voto aberto - Collor renunciaria três meses depois,minutos antes do início da sessão do Senado que decidiria cassar seu mandato e lhe tirar os direitos políticos por oito anos. Mas em todos os governos eles ocorreram. Não prosperaram porque o presidente da Câmara de então os engavetou.

Foram 2 contra o presidente Itamar Franco, 26 contra Fernando Henrique Cardoso e 27 contra Luiz Inácio Lula da Silva. Todos arquivados por ordem do presidente da Câmara. Entre os que pediram o impeachment de FHC, figuram o então presidente do PT, José Genoino, e os então deputados Miro Teixeira (PDT-RJ), Luiza Erundina (PSB-SP), Walter Pinheiro (PT-BA), Lindberg Farias (PT) e Milton Temer (ex-PT, hoje no PSOL). De Lula, somente um parlamentar pediu o impeachment. Foi o hoje vice-governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB).

Do ponto de vista técnico, estão entre as prerrogativas do presidente da Câmara a possibilidade de rejeitar projeto que julgar inconstitucional ou pedido de destaque que desfigurar o sentido da votação, assim com intervir nas comissões permanentes ou especiais e anular votação que considere irregular. Do ponto de vista político, é um interlocutor privilegiado do presidente da República, do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e dos ministros.

Para ter idéia do poder de um presidente de Câmara, basta verificar a votação do projeto que criou a Lei das Micro e Pequenas Empresas, aprovado em dezembro. Sem alarde, Aldo Rebelo negociou com o presidente Lula e com a equipe econômica as concessões que foram feitas.

Aldo ligava para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e dizia: 'Receba aí o Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) para falar das microempresas'. Mantega respondia que só iam lá para pedir coisas, que exigiam concessões demais. Aldo retrucava que o contato era importante. Depois, chamava o grupo de parlamentares e dizia: 'Estou sabendo que vocês querem R$ 11 bilhões. Não dá, quebra o Tesouro. Vamos negociar coisa menor'. E, assim, o projeto foi aprovado, com os aplausos do presidente Lula.

Em fevereiro de 1991, o deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) assumiu a presidência da Câmara. Não se dava com o então presidente Collor, que sempre fazia ameaças. A Câmara iniciou seus trabalhos no dia 15, uma sexta-feira sem votação. Na terça-feira, dia 19, Ibsen sacou um projeto do então deputado Nelson Jobim (PMDB-RS) que tirava poderes de edição de medidas provisórias do presidente da República e o votou. Collor tomou um susto. Conseguiu brecá-lo no Senado, onde tinha maioria. Mas Ibsen avisou a Collor que havia ali um presidente da Câmara. Um ano e meio depois, foi ele quem autorizou a abertura do processo de impeachment.