Título: Mesmo foragido, promotor recebeu R$ 10 mil por 5 anos
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2007, Nacional, p. A12

O contribuinte sustentou, durante vários anos, a fuga de Igor Ferreira da Silva, ex-promotor de Justiça que matou com dois tiros a mulher, a advogada Patrícia Ággio Longo, grávida de sete meses, numa estrada de Atibaia, Grande São Paulo, em junho de 1998.

Condenado a 16 anos e 4 meses de prisão - formalmente denunciado pela Procuradoria-Geral de Justiça por homicídio qualificado e aborto -, Igor está foragido até hoje. Ele atribuiu o crime a um assaltante, que jamais foi identificado.

Enquanto a Justiça não decretou a perda de seu cargo, o que demorou quase cinco anos, Igor continuou recebendo seus vencimentos como promotor, cerca de R$ 10 mil.

A polícia informa que está à caça de Igor, que antes de ingressar no Ministério Público paulista foi delegado. Há suspeitas de que ele teria saído do País. Passou pelo Paraguai e, depois, seu refúgio foi o Uruguai.

O caso não é o único. O contribuinte continua pagando os salários de outro promotor de São Paulo, que também é réu por assassinato, mas ainda não foi julgado.

Thales Ferri Schoedl tinha 26 anos quando matou a tiros o jogador de basquete Diego Mendes Modanez, de 20 anos, às 4 horas do dia 30 de dezembro de 2004 em um luau na Riviera de São Lourenço, Bertioga, litoral paulista. Os tiros do promotor também atingiram Felipe Siqueira Cunha de Souza, que sobreviveu.

Preso, Thales alegou que Diego, Felipe e outros rapazes haviam mexido com sua namorada, Mariana Ozores Bartoletti. Ele teria, então, advertido o grupo. Sentindo-se acuado, sacou a arma, uma pistola Taurus calibre 380 que levava sob a camiseta, e disparou. Seus advogados alegam que Thales agiu em legítima defesa.

O procurador-geral de Justiça, Rodrigo Cézar Rebello Pinho, denunciou o promotor por homicídio qualificado - motivo fútil. Para o chefe do Ministério Público, Thales 'não deveria estar armado no local'. O Tribunal de Justiça desclassificou a acusação para homicídio simples.

O promotor chegou a ser excluído da instituição, por decisão do Conselho Superior, mas o Órgão Especial do TJ decidiu, em votação unânime, que ele retornasse ao cargo. Os desembargadores do TJ decretaram a nulidade da decisão do Ministério Público que havia determinado o não-vitaliciamento do acusado.

Pouco tempo depois do crime, Thales ganhou liberdade provisória porque o tribunal acatou a alegação da defesa de que ele teria atirado após ser ameaçado.

Como promotor, Thales tem direito a foro privilegiado e a ser julgado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça.

'A Constituição diz que o promotor processado por crime tem a prerrogativa do foro, que no caso é o Tribunal de Justiça', declarou José Carlos Cosenzo, presidente da Associação dos Membros do MP. 'Mas acho que isso é até pior para o promotor. Seria melhor, para garantia de sua ampla defesa, que ele fosse a júri popular. A Constituição é conflitante. O juízo natural para crimes dolosos contra a vida teria que ser o Tribunal do Júri. Acho incoerência ser julgado pelo TJ. O promotor perde em segurança jurídica.'