Título: Para especialistas, muitos fatores pesarão até 2010
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/01/2007, Nacional, p. A5

O risco de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentar um terceiro mandato já em 2010, como sugeriu o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, não deve ser descartado, mas depende de tantas variáveis que ainda é cedo para ser levado a sério. Essa é a avaliação dos especialistas ouvidos ontem pelo Estado. O gosto do presidente pelo poder, as inclinações hegemônicas dos petistas e outros grupos ligados ao governo, são dados reais, dizem eles. No entanto, não seria tão simples dobrar a oposição e a opinião pública para mudar a Constituição e permitir uma nova candidatura do presidente.

¿Movimentos podem ser feitos nessa direção, não só pelo presidente Lula, mas também com a construção de apoios através de mobilização de movimentos sociais¿, diz a cientista política Lourdes Sola. ¿O modo como Leôncio desenvolve sua tese, já levando em conta as cautelas apresentadas, faz sentido¿, admite o ex-ministro da Cultura Francisco Weffort. Mas os dois se afastam um pouco da opinião de Leôncio, por diferentes motivos. Ela ressalta que ¿há também na sociedade brasileira e na classe política movimentos e sobretudo interesses contrários que poderão inibir o presidente ou obrigá-lo a recuar¿. E Weffort destaca que o próprio autor da idéia impõe tantas condicionantes que fica difícil examinar a questão. ¿Acho que na conclusão sobre as chances de Lula tentar o terceiro mandato seguido há um excesso de antecipação no tempo¿, diz o ex-ministro.

Raciocínio semelhante faz o professor Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais. Para ele, ¿se o cavalo passar arriado, prontinho, sem custos nem riscos, qualquer político se disporá a montá-lo¿. No entanto, em sua avaliação as chances para a ocorrência de todas as circunstâncias favoráveis, mencionadas por Leôncio Martins Rodrigues, ¿são muito pequenas, mesmo que se leve em conta a existência, no PT, de um grupo que buscou sempre um poder hegemônico¿.

Para o cientista político Celso Roma, da USP, o desejo real do governo, ao lançar o Plano de Aceleração do Crescimento, é viabilizar um candidato para daqui a quatro anos ¿ não necessariamente o presidente. Por isso é preciso que o plano defina e valorize certas realizações, a serem eleitoralmente direcionadas para alguém. ¿Eles sabem que não dispõem de um bom nome hoje e querem ir atrás dele. Mas se esse nome será o próprio Lula, ainda não dá para dizer¿, avisa Roma.

Além disso, tanto para ele quanto para Reis a idéia de mudar a Constituição é problemática. ¿Seria um casuísmo, algo bem diferente do que fez Fernando Henrique Cardoso em 1995. Uma reeleição no regime presidencialista é uma coisa normal, existe e dá certo nos Estados Unidos. Mas se acrescentarmos uma terceira eleição seguida já estamos falando de outro conceito de democracia, e essa discussão não é nada simples¿, avisam os dois.

Mas Lourdes Sola adverte que, nesse processo, poderão pesar os recursos de comunicador do presidente Lula, que ¿contribui para a construção de sua imagem e do seu governo como `excepcional, único, imprescindível¿¿. Essa retórica ¿é instrumental politicamente, pouco importa seu teor de verdade¿, prossegue a professora. Ela destaca também ¿a relação mais que ambígua com um Legislativo que pode, sim, vir a apoiar tentativas de mudar as regras de acesso ao poder¿.

Por fim, a professora conclui que o PAC ¿é uma aposta estratégica de Lula¿. Se der certo, ¿terá também o apoio de empresários e de setores do mercado financeiro¿. Em função disso, ela prevê sucessivos ¿testes de stress¿ para a democracia brasileira.