Título: Explosão de violência deixa 3 mortos
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Fonte: O Estado de São Paulo, 24/01/2007, Internacional, p. A10

Uma greve geral convocada pelo grupo xiita Hezbollah e seus aliados para desestabilizar o governo pró-Ocidente do primeiro-ministro Fuad Siniora acabou ontem em violência e deixou ao menos três mortos e 133 feridos no Líbano.

A greve, que paralisou boa parte do país, deveria ser pacífica. Mas, depois de bloquear ruas e estradas no entorno da capital com pneus em chamas, os manifestantes da oposição entraram em choque com simpatizantes do primeiro-ministro. Beirute foi coberta por uma cortina de fumaça, todo o comércio foi obrigado a fechar as portas e muitos vôos foram cancelados porque os passageiros não conseguiram chegar ao aeroporto.

A polícia foi enviada a muitas partes do país para tentar manter separados os integrantes das duas facções, que em algumas regiões se agrediam com pedras e bastões e em outras trocavam tiros. Duas das mortes ocorreram na cidade de Trípoli, um reduto sunita no norte do Líbano. A terceira ocorreu em Batron, também no norte, onde houve enfrentamentos entre movimentos cristãos a favor e contra o governo.

Siniora foi obrigado a adiar na última hora a viagem que faria à França porque era perigoso tentar chegar ao aeroporto. O premiê deveria participar amanhã, em Paris, de uma conferência internacional na qual pretendia arrecadar US$ 7 bilhões para reconstruir as cidades devastadas pelos bombardeios israelenses, no ano passado. ¿Permaneceremos unidos contra essa campanha de intimidação¿, disse Siniora, em pronunciamento na TV. ¿A greve geral de hoje ultrapassou todos os limites, lembrando os tempos de guerras e disputas.¿

No final da tarde, a oposição anunciou o fim da greve geral, alegando que ela já havia cumprido seu objetivo - ¿servir de advertência¿ para o governo de Siniora. O episódio, porém, foi mais uma evidência de que as disputas políticas e sectárias estão se aprofundando no Líbano e podem ser um grande obstáculo para a recuperação econômica do país.

De um lado, está o governo de Siniora e seus aliados, grupo apoiado pelo Ocidente que reúne muçulmanos sunitas, cristãos e drusos. Do outro, a oposição inclui o Hezbollah, o movimento Amal, também xiita, e alguns grupos cristãos, como o partido de Michel Aun e os aliados do presidente Émile Lahud.

O Hezbollah e seus aliados, apoiados pelo Irã e pela Síria (país que manteve tropas no Líbano de 1976 a 2005), abandonaram o governo em novembro. Na época, seis ministros ligados ao grupo renunciaram porque Siniora resistiu às suas exigências de indicar 8 dos 24 ministérios, o que lhes daria poder para vetar decisões e até derrubar o atual gabinete.

Na seqüência, a oposição lançou no dia 1° de dezembro uma ampla campanha para desestabilizar Siniora e obrigá-lo a ceder mais participação no governo. Milhares de pessoas ficaram acampadas em frente a prédios públicos por semanas, impedindo ministros de voltarem para casa.

A greve geral de ontem serviria para dar fôlego a esta campanha e fazer uma demonstração de força num momento em que Siniora tenta convencer a comunidade internacional a financiar a reconstrução do Líbano. A oposição alega que a ajuda do Ocidente tem como única finalidade fortalecer o premiê na queda de braço com o Hezbollah.

Além disso, ela também critica um projeto de reforma econômica que Siniora pretendia apresentar na conferência em Paris. O plano do premiê prevê a privatização de empresas, o aumento de impostos e a contenção de gastos para sanear as contas públicas, mas rejeita uma elevação dos salários.

ENTENDA O CASO

13/11/2006: Gabinete de Fuad Siniora perde seis membros com renúncia de partidários do Hezbollah, Amal e de ministro leal ao presidente pró-Síria, Émile Lahud

14/11/2006: Líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, alega que governo de Siniora perdeu credibilidade após renúncia de ministros

21/11/2006: O ministro cristão anti-Síria Pierre Gemayel é assassinado a tiros em Beirute

23/11/2006: Multidão de 800 mil pessoas pede renúncia de Lahud durante enterro de Gemayel

1/12/2006: Siniora se refugia na sede do governo por protestos de 800 mil partidários do Hezbollah

10/12/2006: No 10.º dia de protestos, multidão pede renúncia de Siniora - Hezbollah alega ter reunido 2 milhões de pessoas