Título: O maior desafio do CNJ
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Fonte: O Estado de São Paulo, 25/01/2007, Notas e Informações, p. A3
Depois de ter dado três meses para que os Tribunais de Justiça (TJs) cortassem todos os salários superiores ao teto estabelecido pela Constituição, que fixou para a magistratura estadual o limite de 90,25% dos vencimentos de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está sendo desafiado por 14 cortes. O prazo acabou e elas não cumpriram a determinação. Algumas alegaram, num documento, que os salários que ultrapassam o teto já eram pagos antes de 2005, quando entrou em vigor a lei que regulamenta os dispositivos da Constituição sobre os limites de vencimentos do funcionalismo. O TJ do Acre nem respondeu ao ofício do CNJ.
Como um ministro do STF atualmente ganha R$ 24,5 mil, os magistrados e servidores dos TJs não podem receber mais de R$ 22,1 mil. Ao todo, o CNJ descobriu 2.978 magistrados estaduais em situação irregular. O caso mais grave é do Tribunal de Justiça de São Paulo, onde mais da metade de seus 2.200 juízes e desembargadores tem vencimentos acima desse valor. A média dos salários acima do teto é de R$ 26 mil. O maior salário, de R$ 34 mil, é pago à viúva de um magistrado.
¿Nossos vencimentos são compostos por verbas que estão na Constituição Estadual e na lei. Têm base legal. Ultrapassam o teto, realmente, mas são verbas que se prendem ao adicional por tempo de serviço e à sexta parte, direitos concedidos a 1,2 milhão de servidores paulistas¿, diz o presidente da corte, desembargador Celso Limongi. O problema é que, embora as Constituições de cada unidade da Federação permitam o pagamento dos mais variados tipos de vantagens funcionais ao funcionalismo, na hierarquia das leis em hipótese alguma elas podem contrariar a Constituição Federal.
Limongi invoca o direito à irredutibilidade de vencimentos e direitos adquiridos com base em antigos textos legais e ameaça levar a discussão para o STF. ¿Ingressei na magistratura em 1969, tenho um patrimônio que não posso jogar fora. A CLT também impede a redução de vencimentos. Luto por aquilo que é justo. Espero que o CNJ faça justiça e, nesse caso, fazer justiça é respeitar a irredutibilidade de vencimentos¿, conclui.
Segundo os presidentes dos TJs que não cumpriram a ordem do CNJ, os vencimentos que excedem a R$ 21,1 mil não podem ser cortados porque, segundo a Constituição Federal, leis posteriores à definição do valor dos salários não podem provocar prejuízos aos trabalhadores. Alguns dirigentes judiciais também afirmam que ¿a magistratura precisa ser tratada de forma particular¿, enquanto outros alegam que vantagens funcionais não devem ser levadas em conta para efeito de adequação do salário aos limites fixados pela Constituição para a magistratura estadual. Segundo eles, o teto se circunscreve apenas ao salário-base, não envolvendo gratificações. Mas os argumentos são controversos, uma vez que o CNJ, por meio da Resolução nº 13, já estabeleceu que somente a remuneração decorrente de atividade da Justiça Eleitoral e magistério, verbas de natureza previdenciária e verbas indenizatórias podem ser excluídas do cálculo de enquadramento dos salários ao teto.
Independentemente das justificativas que apresentaram, o fato é que os 14 TJs desafiaram o órgão criado pela Emenda Constitucional nº 45 para promover o controle externo da magistratura. Por isso, conscientes de que estariam desmoralizados caso não reagissem à altura, os conselheiros do CNJ abriram na última terça-feira 14 procedimentos administrativos, um para cada corte rebelada, e marcaram uma reunião para o próximo dia 31, quando avaliarão as explicações dadas pelos presidentes dos TJs. Se ficar provado que os argumentos invocados para manter os supersalários carecem de base legal, esses dirigentes podem ser aposentados compulsoriamente e até afastados da magistratura.
Como se vê, o clima é de confronto e, dependendo dos desdobramentos, os avanços realizados até agora na modernização do Judiciário podem ser anulados, caso o CNJ não consiga enquadrar os TJs rebelados. O que está em jogo é a sobrevivência do controle externo sobre a magistratura.