Título: Diferenças mantêm vivo risco de nova guerra civil
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Fonte: O Estado de São Paulo, 26/01/2007, Internacional, p. A10
O Líbano chegou esta semana à encruzilhada que pode definir seu sucesso ou fracasso como país nos próximos anos. A opinião é de analistas políticos libaneses, para quem os conflitos - que no total deixaram 7 mortos e mais de 200 feridos desde terça-feira, apesar dos apelos dos líderes políticos pela paz - mostraram que as profundas diferenças políticas e sectárias que dividem a população libanesa ainda mantêm vivo e bem aquecido o risco de uma nova guerra civil.
¿A partir de agora, ou as facções rivais chegam a um acordo para formar um governo de coalizão com força suficiente para liderar a reconstrução do Líbano ou é melhor já começarem a pensar na estratégia que adotarão quando um novo conflito explodir no país¿, disse ao Estado o cientista político libanês Fawaz Gerges, da Faculdade Sarah Lawrence, nos Estados Unidos. ¿O que está em jogo, em última instância, é a capacidade de o Líbano construir uma democracia estável e uma economia próspera no médio e longo prazo para evitar se tornar mais um Estado problemático no Oriente Médio.¿
O Líbano é um mosaico de identidades étnicas e religiosas. Há três décadas, cristãos, muçulmanos sunitas, muçulmanos xiitas e drusos, que dividem os exíguos 10.230 quilômetros quadrados de seu território, se enfrentaram numa guerra civil (1975-1990) que matou 150 mil pessoas e arrasou o país.
Os libaneses estavam se recuperando do conflito quando foram atingidos pelos bombardeios israelenses, no ano passado. O objetivo de Israel era desmobilizar o grupo xiita Hezbollah, mas o resultado da ação militar foi justamente o contrário. Boa parte da população libanesa considerou que o Hezbollah saiu vitorioso do confronto com Israel. Já o governo pró-ocidental do primeiro-ministro Fuad Siniora perdeu o apoio e a confiança dos libaneses por não ter conseguido defender a população dos ataques.
Com o novo equilíbrio de forças pendendo para o lado do Hezbollah e seus aliados, o grupo xiita passou a exigir maior participação no governo, o que elevou as tensões com a facção que apóia Siniora.
O que ainda não havia ficado claro é se haveria, na sociedade libanesa, os ingredientes para a explosão de um novo conflito interno. Ou seja, se apesar do trauma causado pela última guerra civil, os libaneses estariam dispostos a pegar novamente em armas para defender suas respectivas facções.
¿Não há dúvida de que ninguém no Líbano quer uma nova guerra civil e que nenhum líder irá defender abertamente o conflito¿, disse ao Estado o libanês Jihad Zein, colunista e editor do jornal Al-Nahar, em Beirute. ¿O problema é que ninguém entra numa guerra civil por vontade própria, nem declarando que está disposto a levar as rivalidades a essas últimas conseqüências. O conflito interno, em geral, é resultado de uma combinação de estratégias erradas e cálculos malfeitos¿, completou.
Para Zein, o grande erro estratégico da oposição libanesa, encabeçada pelo Hezbollah, foi colocar a população nas ruas. A greve geral era para ser pacífica, mas seu saldo foi destruição, mortes e violência descontrolada. O conflito entre estudantes, ontem, seria ainda mais alarmante, porque sequer foi desdobramento de uma ação planejada nos escritórios da oposição.
¿Os confrontos foram uma manifestação de violência espontânea, o que mostra que a sociedade libanesa está polarizada e os líderes políticos podem perder o controle da situação a qualquer momento¿, disse Zein.