Título: Rombo é do Tesouro, não da Previdência Social, diz Lula
Autor: Kuntz, Rolf
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2007, Economia, p. B1

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que não há déficit da Previdência, mas do Tesouro, defendeu a redução gradual dos juros, conclamou os empresários a pressionar os governos pela conclusão da Rodada Doha e justificou a estatização do petróleo e do gás bolivianos. Além disso, falou a favor do presidente venezuelano Hugo Chávez, garantiu que a América Latina está comprometida com a democracia e prometeu segurança a quem quiser investir no Brasil.

De manhã, o presidente Lula participou de uma sessão exclusiva do Fórum Econômico Mundial e de um encontro com 57 executivos de multinacionais. À tarde, encontrou empresários e políticos e participou de outras atividades do Fórum, juntamente com o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, o novo presidente mexicano, Felipe Calderón Hinojosa.

Na primeira aparição de ontem, Lula fez um discurso de quase 20 minutos e respondeu a perguntas do diretor e fundador do Fórum, Klaus Schwab, e do público. Menos de metade do auditório estava ocupada. Em 2003, quando era uma novidade, havia gente em pé. No discurso ele enumerou realizações do primeiro mandato, falou sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e usou uma porção de vezes a expressão ¿nunca antes no Brasil¿ e outras equivalentes.

Defendeu a participação da iniciativa privada nas obras de infra-estrutura, mas prometeu modernizar os portos e investir noutros projetos com ou sem a colaboração das empresas. Ou vai ou racha, anunciou Lula. Prometeu também criar uma extensão universitária e uma escola técnica em cada cidade-pólo. Fez o elogio da prudência, disse que não há mágicas em economia e falou mal dos pacotes de outros governos.

Numa entrevista no começo da noite, disse que o vai ou racha vale também para a política de crescimento, mas demonstrou cautela ao falar dos juros e do controle da inflação.

A defesa da redução gradual dos juros, de manhã, foi parte da resposta ao empresário mexicano Gilberto Marín Quintero, fabricante de fraldas e freqüentador habitual do Fórum. Não se pode cortar os juros arbitrariamente, argumentou Lula, porque o financiamento do governo depende da confiança do mercado. Mas o empresariado, acrescentou, tem acesso a juros menores que os da taxa Selic para custear seus investimentos e os agricultores têm crédito especial. Foi mais uma demonstração de apoio ao Banco Central, depois do mal-estar criado quando o ministro da Fazenda, no lançamento do PAC, sugeriu o corte mais veloz dos juros.

Em resposta ao mesmo empresário, Lula explicou sua posição quanto às contas da Previdência. Segundo o presidente, os constituintes de 1988 tomaram a decisão política de estender os benefícios previdenciários, oferecendo amparo a trabalhadores do campo e a idosos que estavam fora do sistema. Essa decisão custou R$ 40 bilhões no ano passado, acrescentou o presidente, e esse é um gasto que o Brasil tem de assumir com recursos públicos. Trata-se de política social, para ajudar pobres que de outra forma estariam dormindo na sarjeta.

As demais pensões, argumentou, são cobertas pelas contribuições de empregados e empregadores e o problema, portanto, não é da Previdência, mas do Tesouro. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ao Estado que três quartos daqueles R$ 40 bilhões correspondem a aposentadorias do setor rural, pagas a pessoas que não contribuíram. Reconheceu que é preciso cobrir a despesa, seja da Previdência ou do Tesouro, mas não indicou a solução do problema.

Horas depois, o presidente disse que será preciso pensar numa política para as próximas gerações e para isso será instalado um fórum especial em Brasília.

Lula defendeu com insistência a integração cultural, física e econômica da América Latina, para promoção do crescimento e fortalecimento da região diante dos grandes interlocutores como os Estados Unidos e a União Européia. À tarde, disse que a proposta da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) morreu, porque não servia para os latino-americanos - opinião contestada pelo presidente mexicano.

FRASES

Luiz Inácio Lula da Silva Presidente

Esse (o déficit da Previdência) é um gasto que o Brasil tem de assumir com recursos públicos

Trata-se de política social, para ajudar pobres que de outra forma estariam dormindo na sarjeta

Não há mágica em economia, mas sim seriedade. Os juros vão continuar caindo na medida em que formos obtendo mais confiança no Brasil

Os países latino-americanos precisam parar de viajar no mundo chorando nossas misérias e colocando a culpa nos outros

Ou vai ou racha

Escutem o que estou dizendo para vocês: nós vamos fazer a economia brasileira crescer de forma sólida, e com distribuição de renda