Título: O crescimento dos EUA
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/02/2007, Notas e Informações, p. A3
Notícias positivas, sobretudo quando contrariam previsões sombrias, costumam ser desdenhadas por economistas e analistas de mercado e pela imprensa que não gosta de boas notícias. Esse comportamento ficou claro, mais uma vez, na divulgação dos resultados da economia americana em 2006, compilados pelo Departamento do Comércio. Dizia-se há algum tempo que a desaceleração da atividade econômica observada no segundo e terceiro trimestres, em parte decorrente do enfraquecimento do dólar em relação a outras moedas, tenderia a se acentuar e logo poderia ser acompanhada de novas pressões inflacionárias. Os dados que acabam de ser divulgados desmentem essas previsões e, por isso, os analistas de mercado e a imprensa lhes dispensaram um tratamento bastante discreto, que não corresponde à importância da evolução que eles traduzem.
O PIB americano cresceu 3,4% no ano passado. É, reconheça-se, um desempenho inferior ao de 2004, quando se registrou aumento de 3,9%, mas melhor do que o de 2005, quando o crescimento foi de 3,2%. É o terceiro melhor resultado desde 2000. A economia mundial, fortemente dependente do ritmo de atividade da economia americana, tem muito a lucrar com esse desempenho.
Esse resultado foi alcançado graças à recuperação observada no último trimestre de 2006, quando a economia americana cresceu 3,5%, bem mais do que a previsão dos economistas, de uma expansão de 3%. Mas é, acima de tudo, um desempenho que pode significar uma mudança na tendência de desaceleração que se desenhava desde o início do ano passado e que produziu especulações sobre ¿pouso¿ mais ou menos suave. Depois de registrar um crescimento excepcional no primeiro trimestre de 2006, de 5,6%, a economia americana mostrou forte desaceleração nos dois trimestres seguintes, quando cresceu, respectivamente, 2,6% e 2%. Parecia uma tendência forte.
No entanto, o desempenho nos três últimos meses do ano surpreendeu. Apesar da retração no mercado de imóveis e na venda de automóveis, o PIB cresceu 3,5%, revertendo a tendência observada desde o início do ano e ajudando a elevar o crescimento médio de 2006 para 3,4% (dado que ainda pode passar por uma revisão). Se os dois segmentos que mais pesaram negativamente fossem excluídos da conta, o PIB americano teria crescido 5,9%, calcula economista de um banco de origem européia que atua em Nova York. Isso significa que o consumo, item que mais pesa no desempenho da economia americana, continua muito aquecido.
A redução dos riscos e dos temores de uma freada na atividade econômica vem acompanhada de notícias boas pelo lado dos preços. As despesas de consumo pessoal apresentaram, no último trimestre de 2006, deflação de 0,8%, o melhor resultado desde 1954. ¿É o melhor dos mundos¿, comemorou o economista de outro banco. ¿Crescimento econômico forte, desemprego controlado e sem pressões sobre os preços.¿
Embora mais comedido nas palavras, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) tem interpretação parecida com essa. Na reunião em que decidiu manter inalterado em 5,25% o juro básico dos EUA, avaliou que ¿a economia vai se expandir a um ritmo moderado nos próximos trimestres¿. Com relação aos preços, considerou que ¿as medições do núcleo da inflação melhoraram nos últimos meses e parece que, com o tempo, as pressões inflacionárias arrefecerão¿.
Há algum temor com relação ao comportamento dos salários. O aquecimento da economia tende a estimular aumentos salariais. Em outros tempos, o custo da folha de pessoal era um componente importante dos preços finais. Mas esse peso vem diminuindo nos EUA, porque em muitas empresas a remuneração está vinculada à produtividade ou aos lucros da empresa. Aumentar os salários de trabalhadores mais produtivos não implica necessariamente elevação do custo da mão-de-obra por unidade produzida, daí não haver impacto direto dos aumentos salariais no preço final dos produtos.
São boas notícias para a economia mundial, que já vinha tendo um desempenho muito positivo. Lamentavelmente, a economia brasileira continua a ser um destoante sinal nesse cenário de otimismo.