Título: Vitória reflete ambigüidades da relação entre Lula e o partido
Autor: Leite, Paulo Moreira
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/02/2007, Nacional, p. A7

Arlindo Chinaglia assume um dos Três Poderes da República numa situação marcada por todas as ambigüidades que envolvem a relação do PT com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Parlamentar destacado de partido que apóia Lula, ele já se mostrou capaz de lhe causar prejuízos imensos. E Chinaglia foi eleito sem nada dever ao presidente. Agora, terá poder de vida ou morte sobre todo projeto relevante a ser debatido na Casa. Poderá ajudar o presidente - mas também poderá atrapalhar o governo.

Acusado pelo deputado Ivan Valente (PSOL-SP) de ser 'tão obcecado por poder como José Dirceu', Chinaglia fez uma campanha com luz própria, em nome de um trabalho de parlamentar cuja eficiência para negociar e produzir consensos é reconhecida mesmo por adversários. Foi eleito com auxílio da ex-prefeita Marta Suplicy, que ali plantou sementes duradouras para ampliar uma influência crescente no partido, e do ex-ministro José Dirceu, que já tinha alvejado Chinaglia em outros confrontos internos, mas viu na disputa com Aldo Rebelo uma oportunidade para mobilizar a sigla na qual é uma liderança reconhecida.

Os primeiros dias de campanha de Chinaglia ocorreram em ambiente de segredo e conspiração. O próprio interessado capturou, inicialmente, o apoio de legendas como PP e PR, mas, com receio de ser apontado como candidato dos mensaleiros abrigados nessas legendas, só decidiu realizar movimentos mais arriscados depois que firmou acordo com Michel Temer, presidente do PMDB e líder da facção não-governista do maior partido do Congresso. A Temer, Chinaglia fez uma oferta irresistível - ter o apoio peemedebista em 2007 e garantir, em troca, apoio do PT para um candidato do PMDB à presidência da Câmara em 2009. 'Era uma oferta com lógica e o PT poderia cumprir, pois é o segundo partido da casa', explica Temer. Já o PC do B de Aldo Rebelo, esclarece o presidente do PMDB, tem apenas 12 deputados. 'Não poderia assumir responsabilidade nenhuma.' Esse acordo, agrupando as duas maiores legendas, assegurava vantagem inicial invejável, mas não garantia a eleição.

Lula chegou a dizer, numa conversa com a Executiva do PT, que preferia Aldo na presidência do Congresso. Uma semana depois, a bancada de deputados fez uma reunião. E decidiu apoiar Chinaglia.

Os votos decisivos foram capturados nos últimos dias. Quarenta e oito horas antes da votação, os aliados de Aldo decidiram formar um bloco de 70 parlamentares, que pretendia, se vitorioso, tomar os principais cargos na Mesa e a presidência das comissões mais importantes. Era tanta ambição para bancada tão pequena que Abelardo Camarinha (PSB-SP) interrompeu a conversa para fazer uma advertência. 'Isso parece o ataque às torres gêmeas', disse. 'Depois, teremos de agüentar a reação americana.'

O contra-ataque ocorreu no dia seguinte, quando Chinaglia, Temer e outras legendas formaram seu próprio bloco, com 270 parlamentares. Num esforço para atrair votos de adversários, o bloco assegurava uma vice-presidência ao PSDB, medida que tornou o voto tucano em Chinaglia aceitável, ainda que jamais obrigatório.